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Teatro Oficina inaugura acervo digital e físico com figurinos que contam a história do Brasil

26/10/2025 07:31 O Globo - Rio/Política RJ

A última quarta-feira, dia 22 de outubro, foi um dia especial para o teatro brasileiro. No país em que a memória é coisa rara, o Teatro Oficina — companhia teatral fundada em 1958, em São Paulo, por José Celso Martinez Corrêa (1937-2003) — promoveu o Dia do Acervo. Na data, foi inaugurada a coleção digital do Oficina, que disponibilizará mais de 3 mil peças, entre figurinos, adereços e objetos de cena, em uma plataforma on-line, estimulando a sustentabilidade. “Foram devidamente catalogados e preservados. Várias das roupas podem ser utilizadas novamente no palco e também alugadas, inclusive por pessoas físicas para ir a uma festa, por exemplo”, diz, orgulhosa, a diretora de cena e diretora geral da Casa de Acervo.Oficina, Elisete Jeremias. “Isso faz com que a gente não precise recorrer à Rua 25 de Março (de comércio popular em São Paulo) para a confecção de figurinos. Dessa maneira, também não compactuamos com o descarte incorreto”, afirma.
Montagem de "Roda viva", de 2019
Paula Caldas
O acervo está localizado em um sobrado de três pavimentos no bairro do Bixiga, a menos de um quilômetro da icônica sede projetada por Lina Bo Bardi (1914-1992) e Edson Elito, inaugurada em 1994. “São 34 anos de história. É também a primeira vez, em quase sete décadas de existência da companhia, que recebemos recursos públicos para fazer esse tipo de trabalho”, emenda Elisete, referindo-se ao edital ProAC da Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo. Entre os figurinos, que costuram o passado, o presente e o futuro, estão looks de montagens de peças emblemáticas como “Hamlet” (1993), “Cacilda!” (1998), “O rei da vela” (2017) e “Roda viva” (2019). Vale lembrar que, em 1966, o Teatro Oficina foi devastado pelo fogo devido a um curto-circuito, e reinaugurado no ano seguinte com a estreia de “O rei da vela”, baseada no clássico de Oswald de Andrade, tonando-se um marco do tropicalismo; em 2023, outro incêndio, no apartamento de Zé Celso, em São Paulo, tiraria a vida do diretor e dramaturgo, cuja veia questionadora e a capacidade de resistência nunca saíram de cena.
Montagem de "O rei da vela" de 1967
Arquivo O GLOBO
ra manter esse patrimônio de pé, Elisete tem uma equipe especializada. Além de artistas da própria companhia, foram contratados técnicos e especialistas, como a conservadora e restauradora têxtil Cláudia Nunes, que ministrou uma Oficina de Conservação e Restauração dos Têxteis para todos os envolvidos. “Ela trouxe não só os métodos, mas uma expertise de quem tem projetos de restauração dentro e fora do Brasil. Cláudia norteou nossos passos”, observa o ator Victor Rosa, coordenador geral do acervo. “Estamos deixando um bem cultural para o futuro. Escolas de Moda, estudantes de artes cênicas e pesquisadores poderão ter acesso a esse material com informações completas”, continua. Segundo Elisete, os figurinos estão organizados em ordem cronológica a partir de 1991. “Cada uma das peças é identificada e catalogada, utilizando a plataforma Tainacan, a mesma do Museu do Ipiranga”, descreve.
Casaco usado por Zé Celso na peça "Os sertões"
Divulgação
A carioca Cláudia Nunes, que atua há 43 anos no Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), frisa que obras têxteis são as menos valorizadas no Brasil. “Primeiro vêm as pinturas, os documentos, o mobiliário. É uma pena. O acervo do Oficina relata mais de 30 anos de história do teatro brasileiro”, afirma. A especialista diz ter dividido o guarda-roupa em categorias, como a de peças raras. “Nesta estão os figurinos usados pelo próprio Zé Celso, como um casaco de tricô, feito à mão, desenhado por Lina Bo Bardi. Descobrimos roupas do carnavalesco e museólogo Clóvis Bornay (1916-2005) e um parangolé original doado por Helio Oiticica (1937-1980) para Zé Celso. Esses figurinos não podem ser vestidos. Podem ser exibidos apenas em eventuais exposições”, diz. Ela ressalta também as particularidades de preservação dos looks que estão disponíveis para locação: “Demandam cuidados maiores”.
Figurinista e atriz do Oficina, Sonia Ushiyama comemora a iniciativa. “O Zé foi uma figura muito importante no cenário teatral brasileiro. Ter acesso ao raciocínio visual que ele tinha é realmente incrível”, conclui.

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