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Silvicultura em alta: cultivo de árvores nativas do Brasil mira na demanda por madeiras tropicais

09/10/2025 07:01 O Globo - Rio/Política RJ

A relação entre o compositor, cantor e multi-instrumentista carioca George Israel — astro da banda Kid Abelha — e seu cavaquinho começa na floresta. Ela não só inspira suas letras e acordes, mas fornece as madeiras nobres de que é feito o instrumento: jacarandá-da-bahia, louro-pardo e mogno-africano. As duas últimas vêm de uma área da Symbiosis, empresa que cultiva árvores brasileiras numa região de Mata Atlântica em Porto Seguro (BA), da qual o músico é sócio.
— Plantar essas árvores é um reflexo da dor do desmatamento, um ato de generosidade na reaproximação entre homem e natureza, junto ao atrativo do carbono — ele diz.
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As mudanças climáticas e a crescente demanda por madeira tropical que não seja de desmatamento reforçam a silvicultura de espécies nativas (SEN) como um negócio atraente e um incentivo para recuperar matas degradadas. Após receber um investimento da Apple, parte da estratégia de descarbonização da big tech, a Symbiosis alcançou 5 mil hectares de cultivo, avançou em pesquisas para tornar as plantas mais produtivas e já prospecta mercados especiais que valorizam as características exclusivas da madeira nativa.
George Israel é só cio da Symbiosis, empresa que cultiva árvores brasileiras numa região de Mata Atlântica em Porto Seguro
Divulgação
A estratégia é dar às suas árvores padrão similar ao do pinus e do eucalipto, espécies asiáticas de crescimento rápido incentivadas no Brasil na década de 1960 em manejos para indústrias como a de papel e celulose. Sem a mesma atenção, tipos nobres brasileiros viraram alvo do extrativismo predatório que ainda ameaça biomas como a Floresta Amazônica.
A Symbiosis produz a partir de 12 espécies selecionadas conforme rapidez de crescimento, produtividade e valor da madeira, além de manter outras 40 variedades de árvores brasileiras em suas áreas de restauração ecológica. Nesse modelo, que pode inspirar projetos na Amazônia, as árvores são exploradas em diferentes ciclos de colheita, mantendo o equilíbrio produtivo, sem corte raso de toda a vegetação. No ano que vem, a empresa abre sua serraria para a primeira colheita comercial, de olho no mercado premium da construção civil e na exportação.
Em maio, o BNDES liberou R$ 77 milhões para a Symbiosis investir nos plantios de árvores nativas na Mata Atlântica, em Porto Seguro, na Bahia em operação inédita que movimentou o mercado.
Divulgação
— O carbono (capturado da atmosfera e estocado na natureza) é um meio de atrair capital e viabilizar o objetivo principal, a produção de madeira — diz o diretor financeiro da Symbiosis, Alan Batista.
Nova fronteira
A SEN constitui uma nova fronteira da economia em áreas já desmatadas. Dados do Ministério da Agricultura indicam que há cerca de 100 milhões de hectares com diferentes níveis de degradação no país — um potencial econômico de até US$ 141 bilhões até 2050, segundo estudo da Orbitas. Só plantios de madeira tropical poderiam faturar US$ 10 bilhões por ano nessas áreas, a contar pela demanda global. Hoje, o Brasil representa 3% do mercado mundial, mas principalmente com o corte criminoso em floresta natural na Amazônia.
Em maio, o BNDES liberou R$ 77 milhões para a Symbiosis investir no plantio de árvores nativas na Mata Atlântica, em operação inédita. Logo depois, foram destinados quase R$ 187 milhões à re.green para restauração de 15 mil hectares na Bahia e no Maranhão. A empresa acaba de ser indicada ao prêmio Earthshot, o “Oscar da sustentabilidade”, promovido por William, o príncipe Gales. O Fundo de Florestas Tropicais para Sempre (TFFF), iniciativa do governo brasileiro, também concorre.
Em setembro, foi criado o BNDES Florestas Inovação, com R$ 25 milhões oriundos do lucro do banco para alavancar o Programa de Pesquisa e Desenvolvimento em Silvicultura de Espécies Nativas (PP&D-SEN), liderado pela Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura. Ele havia começado com US$ 2,5 milhões do Bezos Earth Fund, veículo filantrópico para o clima do bilionário Jeff Bezos, fundador da Amazon. No momento, as ações abrangem pesquisas em Rondônia e na Bahia para melhoramento genético e manejo de espécies de madeira. Com os recursos não reembolsáveis do BNDES, o programa multiplicará por dez a estrutura de pesquisa para impulsionar plantios comerciais de árvores de alto desempenho e produtividade da madeira.
Estudos apontam que 1,7 milhão de hectares seria suficiente para suprir a alta demanda por madeira tropical, com potencial de capturar 20 milhões de toneladas de CO₂. Isso exigiria investimento total de R$ 42,5 bilhões a R$ 68 bilhões. O retorno estimado é de US$ 2,39 para cada dólar aplicado em pesquisa no setor.
— Queremos atingir grande escala a ponto de competir no mercado de madeira, recuperar áreas degradadas e somar esforços na descarbonização da economia

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