
Análise: Libertação dos reféns pode transformar a sorte política de Netanyahu
O período que antecedeu o acordo de cessar-fogo com o Hamas não foi fácil para o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu. Após condenar a criação de um Estado palestino nas Nações Unidas, ele foi obrigado a aceitar, pelo menos, a possibilidade futura disso ocorrer apenas três dias depois, na Casa Branca. Quando a aceitação do Hamas ao plano do presidente dos EUA, Donald Trump, para encerrar a guerra em Gaza veio acompanhada de tantas ressalvas que seus aliados a consideraram uma rejeição, Netanyahu foi pressionado a concordar com ela de qualquer maneira. E depois de prometer a Israel uma “vitória total” que garantiria que o enclave “nunca mais” pudesse ameaçá-los, o líder concordou em retirar suas tropas antes que os rivais sinalizassem qualquer forma de desarmamento, muito menos com a rendição ou a renúncia ao seu papel no governo de Gaza.
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Ainda assim, o premier pode receber todos os reféns israelenses de volta em casa, proporcionando aos israelenses o alívio e o encerramento que eles tanto desejavam. Uma visita esperada de Trump permitiria que ele desfrutasse do brilho e da glória refletida de uma celebração nacional. E ele já está aludindo à possibilidade de coisas maiores e melhores para Israel.
“Se Deus quiser, continuaremos juntos para alcançar todos os nossos objetivos e expandir a paz com nossos vizinhos”, escreveu ele no X algumas horas após o acordo ter sido selado em Sharm el-Sheikh, no Egito.
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Para Netanyahu, que enfrenta eleições até outubro de 2026 — embora elas possam ocorrer antes, se seu governo cair ou ele decidir antecipar o calendário —, a reviravolta na sorte é gritante, diz Asaf Shariv, analista político e ex-diplomata israelense.
— Se ele pudesse antecipar as próximas eleições para daqui a uma semana, ele o faria — afirma.
Um memorial improvisado em Tel Aviv no segundo aniversário dos ataques de 7 de outubro, na terça-feira
David Guttenfelder/New York Times
Reuven Hazan, professor de ciências políticas da Universidade Hebraica, considera o acordo uma “virada de jogo” para o primeiro-ministro:
— Estamos a menos de um ano das eleições, provavelmente muito menos, e ele estava caminhando para uma campanha que o teria destruído de todos os ângulos possíveis.
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O fim da guerra pode até mesmo aliviar a ampla pressão pública sobre Netanyahu para exigir que judeus ultraortodoxos sirvam nas Forças Armadas, especulou Hazan — uma mudança que ele tem evitado porque os partidos ultraortodoxos são membros críticos de sua coalizão.
Agora, Netanyahu poderá dizer que dizimou o Hamas, depois de obter vitórias sobre o Irã e o Hezbollah, acrescenta Hazan.
— Ele dirá: ‘Dêem-me mais um mandato e eu proporcionarei a normalização com os Estados do Golfo e redesenharei o mapa desta região.
Netanyahu também parece ter encurralado seus parceiros de coalizão de extrema direita, Bezalel Smotrich e Itamar Ben-Gvir, para que permaneçam ao seu lado até agora. Embora Smotrich tenha dito na quinta-feira que não votaria a favor do cessar-fogo, ele afirmou sentir “imensa alegria” com a libertação iminente dos reféns e não ameaçou deixar a coalizão, como costumava fazer no passado.
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Tudo isso sugere que Netanyahu terá muito com que trabalhar. “Veremos a repetição do clássico Bibi”, crava Shalom Lipner, analista político que trabalhou para o premier anos atrás, usando seu apelido.
— Não há ninguém mais em seu nível: [ele dirá] "Ninguém mais poderia ter administrado um relacionamento com a Casa Branca da maneira como administrei." Vamos trazer os reféns para casa, os membros de sua coalizão serão contra alguns aspectos disso e a oposição ficará confusa porque também apoia um acordo.
Isso permitiria a Netanyahu “dividir para conquistar”, acrescenta Lipner.
— E ele esperará poder usar isso para afastar toda a negatividade dos últimos dois anos e seu papel nisso em primeiro lugar.
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