
O poder da gratidão: como treinar sua mente para parar de reclamar e ver o lado bom da vida
O elevador demora. A fila do supermercado é interminável. O metrô chegou lotado. Meu chefe manda mensagens demais. Este bar é muito barulhento. Que tédio ficar em silêncio. Estou com dor no corpo por tanto malhar. Odeio o inverno, mas não suporto este calor. Estou exausto porque fiz muitos planos ou deprimido porque não vi ninguém a semana inteira. A internet vive caindo. Uso demais o celular. O café está um pouco frio ou quente demais. Sem perceber, muitos de nós passamos o dia fazendo um balanço de nossas reclamações.
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Estamos sempre nomeando, compartilhando, pensando e repensando obsessivamente sobre cada uma dessas reclamações. Voltamos a nomeá-las e compartilhá-las. Embora cada uma tenha sua parcela de razão, o que começa como uma válvula de escape se transforma em um hábito nocivo: filtrar a realidade através do que está faltando, do que irrita, do que sempre poderia estar melhor, em vez de apreciar o que funciona, o que temos, o que está bem.
O viés negativo, dizem os especialistas, é uma herança evolutiva intrinsecamente ligada à sobrevivência.
— Detectar ameaças e problemas, historicamente, teve maior valor adaptativo do que notar o que funciona. Por isso, os sistemas de atenção e memória humanos privilegiam o negativo e se concentram nas carências, incômodos e perigos — explica Macarena Gavric Berrios, psicóloga clínica especializada em transtornos de personalidade e do desenvolvimento.
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Hoje, no entanto, esse radar defensivo, que em seu momento, e em certos momentos, foi e continua sendo funcional, parece estar ligado 24 horas por dia, 7 dias por semana, mesmo quando não há perigo ou problema real. Por outro lado, a prática da gratidão — o mecanismo inverso da reclamação — traz múltiplos benefícios para a saúde, tanto física quanto mental.
Os benefícios de praticar a gratidão
Ao longo dos anos, a gratidão foi valorizada por filósofos, políticos, escritores, monges e artistas. Jean Baptiste Massieu a chamou de “a memória do coração”. Cícero a definiu como “a mãe de todas as virtudes”. Sêneca afirmou que é “o antídoto definitivo contra a amargura e a inveja”. Goethe dizia nunca ter conhecido alguém verdadeiramente inteligente e ingrato. Charles Dickens recomendava refletir sobre as bênçãos presentes — que todos têm em abundância — em vez das desgraças passadas, que todos conhecem em alguma medida.
Dependendo do contexto, o significado da palavra "gratidão" varia. De acordo com um ensaio publicado pelo National Institutes of Health (NIH), gratidão pode ser definida como “a apreciação do que é valioso e significativo para si mesmo; um estado geral de reconhecimento e apreço”. Entre seus múltiplos benefícios, os especialistas destacam:
1. Treina os “bons” circuitos neurais
Em termos científicos, a relação entre gratidão e bem-estar foi demonstrada por meio de estudos e pesquisas. O neurologista Alejandro Andersson, diretor do Instituto de Neurologia de Buenos Aires (INBA), explica que a prática regular dos dois ativa diferentes áreas do cérebro:
Córtex pré-frontal medial – ligado à regulação das emoções e à tomada de perspectiva. O aumento da sua atividade ajuda a inibir a amígdala, estrutura essencial na resposta ao medo e à ansiedade.
Córtex cingulado anterior – associado ao desenvolvimento da empatia e à integração de experiências emocionais.
Núcleo accumbens e estriado ventral – parte do circuito de recompensa, responsável pela formação de hábitos.
Ínfula – envolvida na percepção corporal e na conexão entre emoção e corpo.
— Esses são os mesmos circuitos neurais que são ativados em experiências de vínculo e altruísmo. Assim como acontece em práticas de meditação ou em experiências positivas de conexão social, o eixo dopaminérgico mesolímbico e o sistema serotoninérgico da rafe são modulados — observa Andersson. Ele ainda acrescenta que o impacto da prática sustentada da gratidão também é observado no aumento de dopamina e serotonina, hormônios ligados à motivação e à estabilidade emocional.
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2. Um “reset” psicológico
Cynthia Zaiatz, neuropsicóloga e chefe de saúde mental do Sanatório Modelo de Caseros, aponta que múltiplos fatores psicológicos e sociais influenciam e intensificam a tendência humana de focar no negativo. Entre eles, estão o medo da vulnerabilidade, o senso de direito exacerbado em pessoas com traços narcisistas ou materialistas, e a falta de habilidades sociais cultivadas na infância.
Ela também destaca que, ao contrário da reclamação — surgida quase automaticamente —, a gratidão exige uma reorientação deliberada da aten
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