
Quase 1 milhão de pessoas usam cigarros eletrônicos e sachês de nicotina no Rio, segundo pesquisa da USP
Quase um milhão de pessoas — mais exatamente 954 mil — usaram cigarros eletrônicos e sachês de nicotina (nicotina sintética em pó consumida por via oral, ao ser colocada entre a gengiva e a bochecha) nos últimos três meses no Estado do Rio, segundo pesquisa inédita da Universidade de São Paulo (USP). Embora a venda desses produtos seja proibida no país, eles continuam amplamente disponíveis e movimentam cerca de R$ 799,5 milhões por ano apenas em território fluminense.
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Os números fazem parte do 1º Levantamento Nacional sobre a Demanda por Bens e Serviços Ilícitos, realizado pela Escola de Segurança Multidimensional (Esem) da USP, em parceria com o Instituto Ipsos. O estudo também mede a propensão dos brasileiros a consumir produtos irregulares em outros setores — como bebidas, combustíveis, vestuário e eletrônicos — e será apresentado hoje em evento na universidade.
Cientistas desvendam os riscos do vape
OK McCausland/The New York Times
Proibidos desde 2009 pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), os dispositivos eletrônicos para fumar — conhecidos como vapes, pods ou cigarros eletrônicos — voltaram a ser alvo de fiscalização mais intensa desde a resolução do ano passado, que reforçou as restrições à venda, à importação, à propaganda e ao uso. Apesar do cerco, eles seguem disponíveis no comércio informal e pela internet.
Além da dependência de nicotina, os efeitos do vape e do sachê sobre a saúde são conhecidos: estudos apontam danos pulmonares e cardiovasculares e aumento do risco de câncer.
Controle com o crime
Para Leandro Piquet, professor do Instituto de Relações Internacionais da USP e coordenador da pesquisa, a proibição acabou empurrando a distribuição do vape para as redes criminosas. Ainda segundo ele, a regulamentação poderia, além de padronizar os produtos de modo a minimizar danos, gerar receita para controlar os impactos à saúde: o estado deixa de arrecadar R$ 1,6 bilhão anuais em impostos com o comércio ilegal desses produtos, de acordo com o mapeamento da universidade.
— De maneira geral, estamos colocando um segmento desse tamanho e com essa demanda à disposição do crime organizado. Com a última proibição e o começo das operações da Polícia Federal contra esse crime, o produto entrou, digamos, numa dinâmica típica de produto proibido. Primeiro focado nas tabacarias, em lojas de conveniência e, mais recentemente, em operações visando a sites eletrônicos de venda, o grosso do comércio deste produto — afirmou Piquet.
Segundo o professor, a maior parte dos produtos é fabricada na China, Indonésia e Índia, e chega ao Brasil por meio de rotas que passam pelo Paraguai — país que se tornou o principal corredor de entrada. Uma nova rota inclui o Suriname.
Os grupos que controlam esse comércio não necessariamente estão ligados a facções como PCC ou Comando Vermelho. São redes menores, especializadas em fraudes fiscais, descaminho e contrabando, que aproveitam as brechas de fiscalização para abastecer o mercado interno.
Impacto nacional
Em escala nacional, o estudo estima que um em cada 21 brasileiros tenha usado cigarros eletrônicos ou sachês de nicotina nos últimos três meses — cerca de dez milhões de pessoas. O mercado ilegal desses produtos movimenta R$ 7,81 bilhões por ano e não gera qualquer recolhimento de tributos. Se regulamentado, o setor poderia render R$ 13,7 bilhões anuais aos cofres públicos.
Piquet alerta que a recente aprovação da legalização dos cigarros eletrônicos no Paraguai, ainda à espera de sanção presidencial, deve agravar o cenário brasileiro:
— A regulamentação no Paraguai tem potencial totalmente explosivo porque certamente será muito pior do que a que teríamos no Brasil. Nossa capacidade de regulamentar um produto desse tipo é muito maior.
A diferença de regras e impostos entre os países do Mercosul tem impulsionado o mercado clandestino. Enquanto no Brasil a tributação sobre produtos de tabaco pode chegar a 80% do preço final, no Paraguai varia entre 18% e 25%. Essa disparidade estimula a entrada de produtos ilegais pela tríplice fronteira, região marcada pela corrupção em postos de controle e pela fragilidade do aparato estatal.
Apreensões aumentam
O Paraguai já é o principal ponto de origem dos cigarros contrabandeados que competem com os nacionais. E o volume apreendido de cigarros eletrônicos mostra o tamanho do negócio desse outro mercado: cresceu 153% entre 2023 e 2024, segundo o Fórum Nacional Contra a Pirataria e a Ilegalidade (FNCP).
Hoje, 32% do mercado brasileiro de cigarros é ocupado por produtos ilegais — sendo 24% oriundos do contrabando e 8% de fábricas irregulares dentro do país.
O levantamento da USP é um estudo quantitativo nacional com três mil entrevistados adultos, realizado de forma híbrida — parte on-line, parte presencial. A margem de erro é de 1,8%, e os resu
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