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Lenda de Hollywood, Kim Novak critica escolha de jovem atriz que a interpreta em novo filme: 'Coisinha frágil e minúscula'

12/10/2025 07:31 O Globo - Rio/Política RJ

Em fevereiro de 1959, Kim Novak esteve no Rio de Janeiro para promover o lançamento de um filme cujo título a atriz americana já não recorda. Mas ela ainda lembra com clareza do nome da marchinha que a inspirou a abandonar a rotina dos compromissos profissionais e se juntar ao carnaval de rua naquele momento. “Pensava: ‘meu Deus, eu só quero sentir o Brasil’. Então voltei para onde estava hospedada, tirei os sapatos e o vestido desconfortáveis e desci para dançar e cantar junto com as pessoas a letra de ‘Me dá um dinheiro aí’. Senti a emoção, a música, o perigo, mas também a paixão”, conta a atriz, de 92 anos, com a voz rascante que lhe é característica, uma das últimas lendas da Era de Ouro de Hollywood.
O episódio envolvendo a famosa canção de Homero Ferreira não está no documentário “Kim Novak’s vertigo”, de Alexander O. Philippe, no qual a estrela eternizada em “Um corpo que cai” (1958), de Alfred Hitchcock — filme que, aliás, a trouxe ao Brasil naquele carnaval — revisita o seu passado. Mas oferece pistas do espírito desbravador e inquieto da artista que foi obrigada a mudar de nome e visual para se transformar na atriz de maior bilheteria do mundo entre os anos 1950 e 1960, antes de abandonar Hollywood e abraçar uma vida reclusa, dedicada à pintura e aos cavalos. “Sei que estou perto do fim. Eu meio que queria contar a minha verdade, expressar realmente quem sou. Sinto que consegui fazer isso com a minha arte. Mas percebi que, neste momento, precisava colocar tudo para fora”, explica Kim, em entrevista durante o Festival de Veneza, no mês passado, onde recebeu o Leão de Ouro honorário, e foi promover a estreia do longa. “Kim Novak’s vértigo” ganhará première no Brasil na Mostra de São Paulo (16 a 30 de outubro).
No documentário, a senhora reencontra o terno cinza de Madeleine, de “Um corpo que cai”. Que sentimentos lhe vieram à cabeça?
Aquele terno cinza representava algo que não gostava na época, que era me passar por alguém que não era, como faz a personagem no filme. Tinha sentimentos conflitantes. Então, quando abri a caixa que continha a peça, arrematada por uma fã em um leilão e enviada à minha agente, aquilo me pegou de surpresa. De repente, a peça me pareceu uma lembrança mais macia. Percebi que os anos podem fazer isso, e com pessoas também. A gente fica mais suave, sabe?
Consegue se expressar mais artisticamente agora, com a pintura, do que fazendo filmes?
Certamente, porque, em uma pintura, sempre mostro o negativo e o positivo. Sempre há tristeza, mas também alegria. Não quero que as pessoas olhem e digam “ah, que quadro bonito!”. Estou interessada em dizer algo. Então, espero que, depois que eu me for, saibam que o tempo todo eu estava pensando em todas as situações da vida para mim, da minha perspectiva. E da perspectiva do meu “eu bipolar”.
Quando começou a carreira, mudou de nome, perdeu peso, consertou os dentes. Gostaria de ser atriz na Hollywood de hoje?
Ah, gostaria tanto... Às vezes, vejo um filme e penso: “Ah, adoraria ter feito isso!”. Porque agora tudo é mais livre. Quando comecei, tudo dependia da aparência. Agora você pode usar qualquer corte de cabelo, se vestir como quiser. Adoraria ter começado a fazer filmes um pouco mais tarde, para aproveitar essa liberdade. Mas a oportunidade me chegou quando chegou, e você tem que fazer o melhor que conseguir com ela.
O nome da senhora voltará às telas em breve com o filme “Scandalous”, no qual o diretor Colman Domingo contará a história de seu romance com o cantor Sammy Davis Jr. O que acha do projeto?
Não tenho objeção em relação a esse filme. Mas importante mesmo é quem irá me interpretar nele, e não consigo pensar em ninguém menos adequado para fazer isso do que a atriz escolhida, Sydney Sweeney. Ela é muito boa, mas diferente de mim... É uma coisinha frágil e minúscula. Não é somente a aparência física, mas tudo a respeito dela, até mesmo a maneira como ela pensa, porque já vi ela expressar suas ideias, e por isso ela me parece uma escolha tão estranha.
Mas a senhora foi consultada sobre o projeto? Eles pediram sua permissão?
Na verdade, queriam comprar os direitos sobre a minha vida, porque eles vêm tentando fazer esse filme há muito tempo. Mas ainda estou viva, então eles têm a liberdade de fazer o que quiserem com a minha biografia. Chegaram a me oferecer muito dinheiro por ela, mas certamente não queria isso. Deveria vender minha alma ao diabo? Estaria fazendo isso se aceitasse dinheiro deles. Mas a questão é que essa atriz foi trazida para o projeto e não posso fazer nada a respeito, a não ser expressar o meu descontentamento. Minha única esperança é que ela receba uma outra oferta irrecusável, planejada para ser filmada ao mesmo tempo que o previsto para “Scandalous”.

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