Logo
Tudo que você precisa saber sobre as eleições em um só lugar

Conheça a disciplina do Pará que coloca o meio ambiente no currículo para todos os alunos

15/10/2025 14:20 O Globo - Rio/Política RJ

Formar um sujeito ecológico. É assim que o professor Mauro Tavares, coordenador de Educação Ambiental da Secretaria de Educação do Estado (Seduc) do Pará, resume o objetivo da mais abrangente disciplina obrigatória do país na área ambiental. Batizada de Educação para o Meio Ambiente, Sustentabilidade e Clima, a matéria passou a fazer parte da vida escolar de alunos do ensino fundamental até o fim do ensino médio no estado do Norte que será a sede da COP30, em novembro.
— A disciplina adota uma visão de educação ambiental contemporânea, crítica, contextualizada, transformadora e sistêmica. A visão da secretaria é que a educação ambiental não se restrinja à identificação de problemas, mas que mobilize os estudantes para a ação, intervenção e busca por soluções — explica Tavares, doutor em Ciências e professor da Universidade da Amazônia (Unama).
No Brasil, mais de 92 mil escolas públicas — cerca de 70% — declararam ter atividades de educação ambiental em 2024, segundo o Censo Escolar. Juntas, reúnem 2,4 milhões de estudantes. Os dados do Censo mostram que a forma mais comum de o tema entrar nas escolas é por meio de projetos transversais ou interdisciplinares (64% das unidades de ensino adotam essa medida) e como conteúdos de disciplinas tradicionais já presentes no currículo (52%). Outros 10% disseram desenvolver a educação ambiental como um eixo estruturante do currículo.
No país, só 11% das escolas, algo em torno de 15 mil unidades de ensino, relataram disponibilizar um componente curricular específico para a educação ambiental. Dessas, quase mil escolas integram a rede estadual do Pará. A disciplina ocupa um tempo semanal da grade horária ministrada por cerca de quatro mil professores. Devido à natureza interdisciplinar do currículo, o componente é ensinado por docentes de diversas áreas do conhecimento, que integram a temática ambiental às suas especialidades originais. Há casos de profissionais de Ciências da Natureza e suas Tecnologias — que engloba Biologia, Física e Química — envolvidos, mas também de Geografia, História, Língua Portuguesa e Artes.
— Na Amazônia, a educação ambiental pode ser entendida como a transmissão de conhecimentos tradicionais — pondera Tavares. — Aqui, o tema é pautado nos modos de viver de culturas que ensinam as inúmeras formas de se relacionar com o meio ambiente sem degradar a flora e a fauna. A política enaltece a importância de se conhecer e conservar a biodiversidade local, assim como valoriza as diversidades culturais amazônicas.
Contra o negacionismo
Mesmo num cenário social e político de muita oposição a medidas de proteção ambiental, segundo o professor, nem a secretaria nem as escolas sofreram qualquer tipo de pressão contrária a essa disciplina até o momento. De acordo com Tavares, essa pressão de diferentes setores contra políticas ambientais é reconhecida e abordada durante as aulas da disciplina, que também não evita a reflexão sobre o negacionismo climático em sala.
— Há no currículo um questionamento de modelos predatórios. Os estudantes analisam como escolhas econômicas, políticas e sociais do passado, fundamentadas em modelos de produção que desconsideram o meio ambiente, são as raízes dos impactos atuais — destaca a o coordenador de Educação Ambiental do Pará.
Os desafios ambientais do estado também são abordados em sala. Segunda maior usina hidrelétrica do país, a instalação de Belo Monte, inaugurada em 2016, no município de Altamira, gera impactos ambientais que ameaçam a fauna, a flora e a subsistência da população humana que vive nos arredores do Rio Xingu. A usina não é citada nominalmente, mas Tavares diz que a disciplina trata dos impactos de grandes projetos hidrelétricos na Amazônia, especificamente na região do Xingu e de Altamira, de forma crítica e contextualizada.
— O currículo trata a questão utilizando o contexto geográfico e as consequências socioambientais para promover reflexão e ações práticas por parte dos estudantes — enfatiza o educador.
Saberes indígenas
Com uma população estimada em 80,9 mil indígenas, o estado paraense é o sexto no país com mais pessoas autodeclaradas dessa forma. Por isso, essa temática é amplamente contemplada.
— Um dos aspectos que a gente aborda é a educação intercultural. Isso permite que os alunos compreendam o conhecimento produzido pela sociedade ocidental, o saber dos brancos, sem que isso leve ao desmerecimento do saber dos povos originários.
De acordo com Maria Eduarda Oliveira Cézar, de 15 anos, aluna da Escola Estadual Oswaldo Cruz, em Capitão Poço, a disciplina é interessante porque leva os estudantes a ter mais aulas práticas e abre os olhos deles para atitudes com impactos no futuro.
— Vou levar muito dessa aprendizagem prática para a minha vida, como saber plantar ou identificar o pH das águas. Da mesma forma, vou carregar para sempre comigo a noção de que o que eu faço hoje afeta meus filhos, meus netos, todas as gerações — conta a jovem.

Fonte original: abrir