Em busca do gelo mais antigo da Terra, cientistas encontram sedimentos escondidos na Antártida
Uma equipe dos Estados Unidos liderada pelo Centro de Ciência e Tecnologia da National Science Foundation, por meio do seu braço dedicado à pesquisa de gelo antigo (NSF COLDEX), identificou, no início de outubro, uma camada profunda de sedimentos sob a geleira da região conhecida como Domo A, situada na Antártida Oriental. O estudo, publicado na revista Geophysical Research Letters, mostra como os processos que ocorrem na base da geleira — e o contacto entre o gelo, as rochas e os sedimentos — podem tanto preservar quanto destruir vestígios essenciais da história climática da Terra.
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O objetivo dos cientistas é localizar núcleos de gelo contínuos que registrem a evolução do clima da Terra ao longo de milhões de anos — até hoje, os núcleos mais antigos remontam a cerca de 800 mil anos. A descoberta da “unidade basal” – uma camada de gelo misturada com sedimentos finos — junto à “Bacia do Polo Sul”, sugere que os sedimentos foram transportados das Montanhas Subglaciais Gamburtsev e depositados ao longo de dezenas de milhões de anos. No artigo, os autores afirmam que “as evidências disponíveis são consistentes com a sedimentação subglacial resultante do fluxo de calor elevado e do derretimento basal ocorrido ao longo de 34 milhões de anos”.
Para explorar essa região remota, a equipe utilizou voos equipados com radar de penetração profunda, que mensuraram parâmetros como gravidade, magnetismo e relevo sob o gelo. Esse mapeamento geofísico revelou uma clara divisão: de um lado, uma zona com gelo e sedimentos irregulares e bastante espessos; de outro, uma área denominada “Complexo Elbow”, onde a camada basal se torna mais fina e o terreno subglacial é mais suave. As medições, realizadas ao longo de cerca de 650 km, mostraram que no Domo A a camada basal pode atingir até um quarto da espessura total da geleira antes de afunilar rapidamente no centro da bacia.
Resultados
As implicações para a ciência climática são duplas. Por um lado, o estudo demonstra que a geologia do leito — ou seja, o formato das rochas e a presença de sedimentos — está diretamente associada à preservação do gelo antigo e, com isso, à reconstrução de como era o clima da Terra em épocas distantes. Por outro lado, ele alerta para o fato de que o acúmulo de sedimentos e o derretimento basal podem destruir esses registros, impedindo a obtenção de núcleos contínuos verdadeiramente antigos. Portanto, a correlação entre substrato e dinâmica do gelo deve orientar a escolha de locais de perfuração no futuro.
Os autores sugerem que a “unidade basal” localizada a montante da Bacia do Polo Sul pode oferecer melhores condições para a preservação de gelo antigo — isto é, estar menos exposta ao derretimento basal. Esse cenário será avaliado em campanhas futuras do NSF COLDEX, que planejam focar em regiões como Allan Hills (onde já foram encontradas amostras de gelo com mais de cinco milhões de anos) e integrar os resultados com perfurações europeias em locais como Little Dome C.
Esta nova investigação reforça a necessidade de realizar uma análise geofísica detalhada da estrutura e da temperatura internas do gelo antes de selecionar áreas de perfuração. A heterogeneidade do substrato — e a complexa interação entre gelo, sedimentos e fluxo de calor — pode alterar profundamente as chances de encontrar núcleos com milhares ou milhões de anos de histórico climático preservado. Como resumem os autores: “Entender como o fluxo de calor varia na base da camada de gelo e como é a temperatura lá é fundamental para encontrar lugares onde o gelo contínuo mais antigo pode ser preservado”.
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