
Sem destinação correta, lixo espalhado na cidade é retrato do descuido coletivo
Há ruas em Campo Grande onde todas as lixeiras sumiram, levadas por ladrões. No lugar delas, sacolas penduradas em árvores viram solução improvisada, até que cães e gatos espalhem o conteúdo pelas calçadas. Também tem muita gente revirando sacos sujos em busca de algo que ainda tenha valor, e o que sobra se espalha sem destino. Essa é apenas a face mais doméstica de uma relação desastrosa com o lixo. A outra, mais escandalosa, aparece nas margens do Rio Anhanduí, cobertas de entulho e dejetos, e nas montanhas de materiais que poderiam ser reciclados, mas apodrecem no aterro sanitário, a prova diária de que a cidade ainda não sabe lidar com o que descarta. Por onde quer que se ande na cidade, em lugares de valorização alta, como Jardim Veraneio, a pontos clássicos de despejo irregular, como ao longo da Avenida Ernesto Geisel, o resultado é uma paisagem de restos de comida, embalagens rasgadas e mau cheiro, reflexo do descuido coletivo e do consumo exagerado, potencializado pela demora na implementação de um plano amplo de destinação de resíduos. Mato Grosso do Sul está entre os quatro estados do País que mais geram lixo por habitante. O sul-mato-grossense consegue produzir mais resíduos que moradores de locais altamente urbanos, como São Paulo. Por outro lado, ainda enfrenta a realidade da baixa taxa de reciclagem e carência de infraestrutura para tratamento. Cada habitante por aqui produz, em média, 0,92 quilo de lixo diariamente o que equivale a 336 quilos por pessoa ao ano, segundo o Anuário Estadual de Mudanças Climáticas. O volume coloca Mato Grosso do Sul em 4º lugar em geração per capita de resíduos sólidos urbanos, ficando atrás apenas do Distrito Federal, Rio de Janeiro e Ceará. Com base na população de quase 3 milhões de moradores, são 982.676 toneladas por ano, ou 2,69 mil toneladas por dia em Mato Grosso do Sul. O levantamento, baseado em dados do Sistema Nacional de Informações sobre Resíduos Sólidos e do Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa de 2024, mostra que 78% dos lixo no Estado têm destinação em aterros sanitários, enquanto 22% ainda seguem para lixões, prática proibida pela legislação ambiental. Apesar da grande geração de lixo, Mato Grosso do Sul não aparece entre os estados com estrutura de tratamento, como compostagem, reciclagem industrial ou aproveitamento energético. Levantamentos do Instituto Água e Saneamento e do Tribunal de Contas do Estado apontam que apenas 54% dos municípios possuem algum tipo de coleta seletiva, mas a maioria das iniciativas cobre apenas áreas centrais. Em Campo Grande, a coleta domiciliar alcança quase 98% da população, mas apenas 0,79% do material coletado é reciclado. Em São Gabriel do Oeste, o índice de reaproveitamento chega a 5,3%, um dos mais altos do Estado, mas ainda distante de padrões considerados sustentáveis. Neste ano, a concessionária responsável pela gestão da limpeza urbana e o manejo de resíduos sólidos na Capital, a CG Solurb, recebeu autorização para ampliar em 3,5 hectares o aterro sanitário do bairro Dom Antônio Barbosa, por conta da alta geração. Ao todo, a nova área deve receber mais 1.338.437 metros quadrados de lixo. O Anuário relaciona a alta geração de resíduos à urbanização crescente e à falta de infraestrutura regionalizada. Além do impacto ambiental direto, o setor de resíduos responde por 2,2% das emissões de gases de efeito estufa em Mato Grosso do Sul, principalmente pela liberação de metano em aterros e lixões. A coleta seletiva ainda é um desafio em Mato Grosso do Sul. Mesmo entre os que afirmam ter coleta seletiva, grande parte ainda não possui infraestrutura consolidada, cooperativas formalizadas ou sistemas de triagem com cobertura integral. A média estadual de reaproveitamento é de 1,8%, valor inferior à média nacional, que é de 2,4%. Veja o mapa da produção de lixo no Brasil: A Agência Estadual de Regulação de Serviços Públicos está realizando um levantamento sobre a situação da limpeza urbana e da destinação final de resíduos em todos os municípios sul-mato-grossenses. O objetivo é mapear o estágio de implementação da coleta seletiva e dos aterros sanitários, mas até o momento o Estado ainda carece de políticas integradas para aumentar o volume de reciclagem. Segundo o TCE, a maior parte das prefeituras enfrenta limitações financeiras e estruturais. Muitos municípios não possuem unidades de triagem, nem contratos com cooperativas de catadores, o que torna a operação da coleta seletiva inviável de forma contínua. Mesmo nas cidades com programas implantados, a cobertura é irregular: há bairros sem atendimento e cronogramas inconsistentes de recolhimento de recicláveis,apontou o levantamento do Tribunal de Contas e do Instituto Água. A ausência de educação ambiental e de campanhas de incentivo também compromete o engajamento da população, que muitas vezes não separa os materiais recicláveis por falta de orientação ou de equipamentos adequados. Outro ponto crít
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