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Conheça a história do bilhete em sapato infantil que, 80 anos após o Holocausto, revelou o nome de um menino morto em Auschwitz

21/10/2025 10:54 O Globo - Rio/Política RJ

Que nome pode sobreviver ao esquecimento 80 anos depois? O silêncio dos corredores do antigo campo de concentração de Auschwitz foi rompido por uma descoberta improvável: um pequeno sapato infantil, marrom e gasto, guardava em seu interior um bilhete dobrado. Nele, uma caligrafia trêmula registrava: “Steinberg Amos, criança, número 5710, nascido em 26 de junho de 1938.” O pedaço de papel, escondido sob a palmilha, transformou um objeto anônimo em testemunho, e devolveu identidade a uma das milhões de vítimas do Holocausto.
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O menino Amos Steinberg nasceu em Praga, em 1938, filho de Aliza e Ludwig Steinberg. A família viveu os primeiros anos sob o peso da perseguição nazista, até ser deportada em 1942 para o gueto de Theresienstadt, e, um ano depois, para Auschwitz. Ludwig foi separado da mulher e do filho logo na chegada. Ele sobreviveu. Eles, não. O bilhete costurado dentro do sapato do menino é, acredita-se, obra da mãe.
Em 2022, durante o trabalho de conservação de calçados infantis no Museu de Auschwitz-Birkenau, a restauradora Elżbieta Cajzer foi alertada sobre o fragmento de papel escondido no forro. “Quando abrimos o sapato, encontramos um pequeno documento. As letras mal resistiram ao tempo”, contou ela ao apresentar o objeto. A equipe percebeu então que o número 5710, associado a Amos, era o mesmo registrado em uma mala já catalogada no acervo do museu — pertencente a Ludwig Steinberg, o pai.
O papel com as informações da criança estava sob a sola do sapato
Divulgação/Museu de Auschwitz
A arqueologia
A correspondência entre o sapato e a mala permitiu que curadores reconstruíssem o destino da família Steinberg. Registros do transporte de deportados de Praga confirmaram que os três foram enviados juntos a Theresienstadt e, depois, a Auschwitz. A descoberta uniu dois objetos que, durante décadas, repousaram em vitrines separadas, e deu rosto a um entre milhares de nomes apagados pela máquina do genocídio.
A mala com o nome do pai de Amos Steinberg
Divulgação/Museu de Auschwitz
“Temos um nome e uma data de nascimento. Isso basta para trazer aquela família de volta, mesmo que por apenas um instante”, disse Wojciech Płosa, diretor do arquivo do museu. Para ele, o bilhete simboliza não apenas a identificação de uma vítima, mas a recusa de uma mãe em aceitar o anonimato imposto por um sistema que numerava e apagava vidas.
O sapato de Amos está hoje exposto ao lado do bilhete e da mala do pai. É uma das raras ocasiões em que as informações pessoais de uma criança morta em Auschwitz sobreviveram no próprio objeto. “Isso mostra a preocupação de uma mãe. Ela queria que o filho não fosse esquecido, acontecesse o que acontecesse”, disse Marcin Barcz, porta-voz do museu.

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