
'Caso zero': a transcrição do primeiro episódio
Produzido pelo jornal O GLOBO, o podcast "Caso zero" investiga um dos acontecimentos mais controversos envolvendo transplantes de órgãos no Brasil. Ao longo de cinco episódios, os jornalistas Bela Megale e André Borges mergulham na história que mudou o rumo dos transplantes no país.
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Abaixo, a transcrição do primeiro episódio:
Sonora de programa de TV: Depois de 23 anos do crime, foi preso ontem o médico condenado por retirar ilegalmente os órgãos do menino Paulo Pavesi.
Sonora de programa de TV: Em abril do ano passado, ele foi condenado a 21 anos e oito meses de prisão, mas a defesa conseguiu um habeas corpus para que ele permanecesse em liberdade. E, na semana passada, o STJ cassou essa liminar.
Sonora de programa de TV: Álvaro Ianhez foi condenado por homicídio duplamente qualificado pela morte de Paulo Pavesi. Esse caso foi no ano de 2000. Ele não tinha 10 anos na época e, segundo a denúncia, o médico forjou a morte cerebral para retirar os órgãos da criança.
Bela Megale: O dia era 9 de maio de 2023. Nessa data, o Dr. Álvaro Ianhez foi preso, acusado de ter matado o menino Paulo Pavesi. O médico era suspeito de fazer parte de uma máfia de transplantes de órgãos. Essa máfia teria atuado em Poços de Caldas entre os anos 90 e 2000. Na época, o caso ganhou a mídia, os jornais, a TV e teve repercussão no país inteiro. Eu sou Bela Megale, sou jornalista e colunista do jornal O GLOBO e cubro a política brasileira desde 2010. Hoje eu vivo em Brasília, mas eu sou mineira, de Poços de Caldas, a cidade onde essa história aconteceu. Eu acompanhei esse caso desde o início. Naquela época eu tinha 16 anos, faz bastante tempo. Com o passar dos anos, eu saí de Poços e fui estudar em São Paulo. Tempos depois, eu me mudei para Brasília e nunca mais voltei naquela história. Mas desde que essa prisão aconteceu, o caso não saiu mais da minha cabeça.
André Borges: Meu nome é André Borges e eu também sou jornalista. De alguma forma, esse caso passou a fazer parte do meu dia a dia e há um bom tempo. Eu e a Bela somos casados, e nos últimos dois anos, essa história virou um dos principais assuntos de nossas conversas lá em casa. Eu estava com a Blla quando a gente escutou a notícia da prisão no rádio. Ela começou a contar um monte de coisas sobre esse caso, histórias que eu nunca tinha ouvido falar. Veio tudo de uma vez. Foi como se a Blla tivesse viajado no tempo e lá para o ano 2000.
Bela Megale: No ano 2000, o mundo era um pouco diferente de hoje, especialmente quando o assunto era a forma que as notícias chegavam para a gente. Quase ninguém tinha telefone celular, por exemplo. As pessoas tinham começado a usar a internet há pouco tempo aqui no Brasil. Mas só pelo computador e com uma conexão bem lenta. A banda larga ainda ia demorar uns anos para aparecer. Redes sociais, então, nem pensar. Os principais meios que a gente tinha para se manter informado eram mesmo os jornais impressos, rádio, alguns portais de notícia e, principalmente, a televisão. E foi na TV que eu escutei a história do menino Paulo Veronesi Pavesi pela primeira vez.
Sonora: A polêmica começou com o acidente sofrido por Paulo Veronesi Pavesi neste prédio, em abril deste ano. Paulo, de dez anos, se divertia na área de lazer do prédio, junto com outros dois meninos da mesma idade. Quando resolveram brincar próximo a esta grade, Paulo se desequilibrou e caiu de uma altura de cerca de dez metros. O menino foi levado por vizinhos para o Hospital Pedro Sanches, que fica ao lado do prédio. De acordo com a família, dois dias depois, foi constatada a morte cerebral de Paulo. Os pais, então, resolveram doar os órgãos. Foi quando começaram os problemas.
Bela Megale: A conta tinha um monte de cobranças exageradas. E como a equipe do hospital não respondia aos questionamentos da família, eles passaram a desconfiar dos médicos e do próprio hospital. Foi aí que eles decidiram procurar a imprensa. Com o tempo, surgiram a suspeita de que esses médicos não tinham feito só um superfaturamento. Na nova versão, esses médicos, na verdade, teriam cometido um assassinato. Mataram o menino Paulo para retirar seus órgãos e alimentar um esquema de máfia de transplantes.
André Borges: O assunto virou manchete no país todo. Os jornais e a opinião pública não demoraram a condenar os médicos. Eles foram chamados de assassinos, de monstros. Das piores maneiras que você pode imaginar. E essa bola de neve foi crescendo. Depois de reportagens, foi a vez dos inquéritos policiais. Um monte de depoimento foi colhido. Teve até exumação de cadáver. Foi tanto barulho que o caso chegou em Brasília. O Ministério da Saúde acabou envolvido. Uma CPI foi aberta no Congresso. Teve gente acusando o político importante de comandar a máfia. O caso resvalou até em movimentações políticas pela sucessão na Pre
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