
Após exibição de 'Manas', cineasta brasileira Mariana Brennand conduzirá seminário em Los Angeles: longa foi elogiado por Julia Roberts
A cineasta brasileira Marianna Brennand conduzirá, na próxima segunda-feira (20), em Los Angeles, um seminário após exibição de seu filme "Manas" no no AFI Conservatory do American Film Institute, local que já recebeu nomes como Martin Scorsese, Sofia Coppola, Guillermo del Toro e Paul Thomas Anderson.
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O convite é fruto do sucesso da carreira internacional do longa-metragem, que estreou no Festival de Veneza, em 2024, e já abocanhou 36 prêmios.
A história de "Manas" gira em torno de uma jovem de 13 anos, moradora da Ilha de Marajó, no Pará, que decide confrontar a engrenagem violenta que rege sua família e as mulheres da comunidade.
O filme, que tem produção executiva do ator Sean Penn e do cineasta Walter Salles, entre outros, representará o Brasil na disputa por uma vaga para o Prêmio Goya, conhecido por ser o Oscar espanhol. 'Manas' foi elogiado por Julia Roberts, que o escreveu como "uma afirmação da vida de uma forma tão triste, linda e mágica".
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Marianna contou ao GLOBO que o maior desafio foi fazer um filme sobre abuso sem trazer mais violência.
Confira abaixo entrevista com a cineasta:
Precisamos falar sobre a abuso. Mas, na prática, não é nada fácil...
O maior desafio foi fazer um filme sobre abuso que não trouxesse mais violência. A ficção abriu portas para construir personagens complexos e não tratar nada superficialmente. Foram 10 anos de pesquisa. Todas as violências são silenciadas por quem faz e por quem sofre. Dá vergonha, medo, algumas mulheres nem entendem que estão sofrendo violência. Outras, são ameaçadas. Às vezes, contava sobre o projeto e diziam: "Ai, não quero saber". Tem gente que não quer nem olhar.
Em nenhum momento, o filme mostra o abuso em si, não há cena expositiva sexual. É o resultado do olhar feminino, mas também da busca para trazer o espectador?
Tudo foi construído dentro da opção de não mostrar a violência gráfica, o abuso em si. Assim como era inadmissível qualquer olhar sexualizado sobre o corpo da menina. Sim, ansiava pela conexão com o espectador, que ele saísse transformado, com vontade de mudar a realidade, gerar debate para que a sociedade apoie mulheres, brigue por políticas públicas e por um judiciário que ofereça acolhimento para a mulher denunciar.
A perspectiva feminina conduziu a narrativa e o set de filmagem.
"Manas" é sobre as violências que vivemos pelo olhar da mulher. Oportunidade de debater como nossos corpos e narrativas estão sendo representados, contar uma história terrível com ética, usando a gramática do cinema a favor. Não tem trilha sonora, a construção da linguagem fotográfica é sensorial, a atuação é seca. A preocupação era não estetizar, embelezar a violência. Não queria que nada tirasse o espectador da Marcielle, que sua emoção estivesse conectada à dela, como se estivesse vendo a vida se desenrolar, sentindo a urgência dessa violência.
Que cuidados tomou com a equipe e as atrizes crianças?
Todo mundo ali tinha a sensação de um propósito. Muitos viveram abuso moral, emocional, assédio sexual. As crianças não leram o roteiro. Fizemos uma preparação de um mês, com conversa e brincadeiras para entender o nível de maturidade emocional, os diferentes estágios de experiências de vida e como se sentiam confortáveis em participar. Tudo para preservar a integridade emocional, psicológica e física das crianças.
Os pais sabiam do que se tratava o filme. É uma realidade próxima deles. Todos tinham ou conheciam alguém que havia passado por uma experiência. Às crianças, só dávamos informações necessárias para conduzir as cenas. Trabalhávamos os diálogos, a gênese, o significado das cenas trazendo o lado simbólico. O norte era jamais fazer com que essa menina precisasse passar por sensações e sentimentos que não eram necessários. Usamos artifícios como a música para alcançar o estado de emoção sem precisar trazer à tona o que estava acontecendo.
Está tudo no corpo da protagonista, que começa brincando de boneca, feliz e, após o abuso, se torna retraída, se fecha para o mundo. É uma perspectiva muito de dentro da situação.
A equipe do filme é 99% feminina. Infelizmente, todas nós já vivemos algum tipo de violência. Emocional, sexual, psicológica, moral. Conseguimos nos colocar ali, sabemos as consequências dos abusos. No corpo, na alma. Trabalhei com minha psicanalista para desenhar um perfil psicológico bebendo em situações que já tinha vivido e pesquisando como essas violências imprimem no corpo. Na hora em que o pai a abraça (a protagonista), ela faz xixi. Geralmente, representações de abuso são na visão do abusador
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