Antônio Gois: Foco em policiamento não basta
O Brasil vivenciou, entre 2022 e 2024, uma onda sem precedentes de ataques violentos a escolas. Diante de um desafio tão complexo, especialistas sempre foram unânimes em destacar que eram necessárias ações coordenadas e intersetoriais, buscando atacar o problema em múltiplas frentes. Uma análise inédita do Instituto Sou da Paz em 67 iniciativas realizadas por redes estaduais e municipais mostra, porém, que a principal resposta desses governos foi o reforço do policiamento e do controle de acesso ao ambiente escolar, com aumento, desde 2023, de 283% nos programas focados exclusivamente nessa abordagem.
Outras ações preventivas, voltadas ao diálogo, mediação de conflitos e promoção da saúde mental, foram relegadas a segundo plano. O levantamento também destaca que, mesmo quando foram identificadas políticas que atuavam em mais de uma frente, as iniciativas, em geral, operavam de forma isolada e desarticulada.
A pesquisa classificou as iniciativas públicas encontradas em quatro categorias: intersetoriais (integrando diferentes secretarias); convivência democrática e cidadã (valorizando a diversidade e o diálogo); quebra do ciclo de produção e reprodução da violência (promovendo reconstrução de relações e responsabilização sem caráter punitivista); e controle de segurança, com aumento da ostensividade ou da presença policial. Foi esta última, que trata, por exemplo, da implementação de barreiras físicas e sistemas de vigilância, sem integração com estratégias pedagógicas, a que mais ganhou destaque.
A crítica ao foco quase único em ações de policiamento e controle não significa, obviamente, que a polícia não deva ser considerada no rol de ações necessárias para aumentar a segurança nas escolas. O investimento em inteligência policial para mapeamento e investigação de ameaças em redes, a intensificação de rondas escolares, e mesmo a participação de agentes da segurança pública em projetos de mediação de conflitos em diálogo com as escolas são algumas das iniciativas mapeadas no levantamento, e que contribuem para aumentar a segurança de estudantes e professores.
Há outros pontos relevantes de atenção. Um deles diz respeito a um mal comum a várias políticas públicas, e não apenas no campo educacional: a falta de avaliação e monitoramento dos resultados. Das 67 iniciativas mapeadas, apenas 21 incluíram informações sobre avaliação e monitoramento e somente sete efetivamente conseguiram mensurar o alcance dos objetivos previstos em termos de redução da violência ou melhoria do clima escolar. Isso aumenta o risco de estarmos gastando tempo e recursos em soluções ineficazes e diminui a chance de aprimorar as práticas a partir de seu monitoramento constante.
Também foi constatado que, dentro do escopo do relatório, iniciativas com foco no desenvolvimento de habilidades socioemocionais são poucas: somente sete, sendo duas ainda em fase de implementação. A necessidade de envolvimento maior dos estudantes nos projetos, o baixo número de ações com recorte de raça, gênero ou de iniciativas de combate ao racismo, machismo e homofobia foram outras lacunas identificadas.
Ao fim, o levantamento reforça que não há atalhos ou soluções únicas, e que a resposta para um problema tão complexo “reside na articulação de políticas preventivas e na profundidade de sua implementação, um compromisso que exige persistência e colaboração.”
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