Trabalhadores de aplicativo veem com ceticismo gesto de Boulos para aproximar categoria do governo
Após tentativa frustrada de regulamentar o trabalho por aplicativo, o governo tenta novas estratégias para se aproximar da categoria, mas nem mesmo a chegada ao governo de Guilherme Boulos, novo ministro da Secretaria-Geral, tem sido vista como algo que fará a diferença. Em entrevista ao GLOBO, Boulos apontou a aproximação com o grupo como prioridade, disse que irá constituir um grupo de trabalho com trabalhadores de aplicativo e admitiu a existência de ruídos na proposta do governo e a necessidade de ouvir esses trabalhadores.
 — A esquerda errou muitas vezes — e aqui não é o governo — porque sempre colocou o que quer para os trabalhadores dessas novas formas de trabalho. Poucas vezes parou para ouvir o que eles querem.
Alas do governo, contudo, avaliam que dificilmente será possível mudar os pontos do texto já em discussão no Congresso ou mexer no que já foi encaminhado e vem sendo discutido pelos parlamentares. 
Por outro lado, governistas ponderam que, a título de pressão, pode ser positivo ter um aliado e um novo negociador dentro do Palácio do Planalto favorável à categoria. Atualmente, o assunto é tratado apenas no Ministério do Trabalho, comandado por Luiz Marinho, que sofre críticas pelo fato de o projeto não ter deslanchado e do segmento ser crítico ao governo.  
O tema é um dos mais complicados para o governo. Após mais de dois anos de discussão, o projeto de lei para garantir direitos a motoristas de aplicativos segue patinando no Congresso. O texto perdeu força após  motoristas de aplicativo e plataformas de entrega criticarem a iniciativa do governo, que viam como inviável o modelo proposto. 
O projeto prevê o pagamento de ao menos R$ 32,09 por hora de trabalho, remuneração de um salário mínimo e contribuição de 7,5% ao INSS.
Ao GLOBO, Boulos disse que irá constituir um grupo de trabalho com trabalhadores de aplicativo e admitiu a existência de ruídos na proposta do governo e a necessidade de ouvir esses trabalhadores:
— A esquerda errou muitas vezes — e aqui não é o governo — porque sempre colocou o que quer para os trabalhadores dessas novas formas de trabalho. Poucas vezes parou para ouvir o que eles querem.
No primeiro dia após a posse, Boulos se reuniu com lideranças dos entregadores de aplicativo no Palácio do Planalto. Na última quinta-feira, o ministro almoçou com integrantes da Aliança Nacional dos Entregadores e recebeu uma carta de reivindicações da categoria. 
O ministro se comprometeu a tratar os temas dentro do governo. Os cinco representantes da categoria levaram também pedidos de isenção de impostos para a compra de veículos e linhas de financiamento com crédito mais baixo, como já ocorre com taxistas.
— Entregamos nossas demandas, mas ele ainda não deu retorno prático do que pode ser feito. Ele disse que esta semana teria mais conversas para ver quem ele acionaria para ter o retorno dessas pautas. Já tivemos diálogo com o governo, no Ministério do Trabalho, e as conversas não avançaram. Então, somos gatos escaldados: levamos nossas demandas, mas sabemos perfeitamente que o que pode trazer alguma conquista é a mobilização da categoria — afirma Nicolas Souza Santos, integrante da Aliança Nacional dos Entregadores.
O relator do projeto na Câmara, Augusto Coutinho (Republicanos-PE), afirma que a última audiência pública do texto deve ocorrer na próxima terça-feira. Em seguida, o relator fará um parecer para discussão na comissão especial que trata da regulamentação do trabalho em aplicativos. Há expectativa de se levar o projeto ao plenário até o final deste ano.
Em maio, na condição de deputado federal, Boulos apresentou um projeto que prevê um valor mínimo de remuneração para serviços de trabalhadores de plataformas digitais de entregas e mototaxistas; estabelece regras de transparência e cria a obrigação de seguro de acidentes. Coutinho afirma que tem analisado o texto para incorporar pontos do projeto de Boulos:
— O Parlamento tem cuidado disso. Estou trocando figurinhas com o ministro Marinho toda hora; ele tem acompanhado toda a discussão. Muitas ideias vieram do projeto que o governo mandou. Não entendi qual é essa missão do Boulos no governo e o que vai mudar.
Boulos quer tentar aproximar do Palácio do Planalto uma parcela relevante de trabalhadores. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PnadC) do IBGE mostra que 1,7 milhão de pessoas trabalhava com serviços por meio de plataformas digitais em 2024 — número que cresceu 25,4% em relação a 2022, quando esses trabalhadores somavam 1,3 milhão.
O levantamento teve recorte sobre trabalho em plataformas digitais e mostrou que a grande maioria dos prestadores de serviços por aplicativo no Brasil ainda trabalha com transporte particular de passageiros, como Uber e 99 (53,1%), ou em aplicativos de entrega de comida e produtos (29,3%). Os 13,8% restantes são de aplicativos de táxi.
O perfil traçado pelo IBGE mostra que esse grupo de trabalhadores é, em sua maioria, formado por homens (83,9%), tem de 25 a 39 anos (47
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