Mistério do fóssil do 'mini tiranossauro' é resolvido após quatro décadas de debate; entenda
Durante quatro décadas, especialistas em dinossauros se envolveram em um debate intenso sobre fósseis diminutos encontrados no oeste dos Estados Unidos. Eles pertenciam a uma versão adolescente do Tyrannosaurus rex ou a uma espécie completamente diferente da família dos tiranossauros?
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Um novo estudo pode ter solucionado a disputa. Paleontólogos afirmaram na revista Nature, na quinta-feira, que um fóssil mantido em um museu da Carolina do Norte pertencia ao Nanotyrannus lancensis, integrante de um grupo distinto de tiranossauros.
“Temos esse animal que estava escondido à vista de todos, e isso levanta todo tipo de questão que nós, paleontólogos, não estávamos fazendo até agora”, disse Lindsay Zanno, paleontóloga do Museu de Ciências Naturais da Carolina do Norte e uma das autoras do estudo.
Um fóssil controverso
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Na década de 1980, caçadores de fósseis encontraram um pequeno crânio de tiranossauro na mesma formação rochosa que havia produzido o T. rex, contou Thomas Holtz, especialista em tiranossauros da Universidade de Maryland, que não participou da pesquisa. Inicialmente, os cientistas identificaram o crânio como pertencente a uma espécie distinta.
Mas, em 1999, outro grupo de pesquisadores argumentou que o crânio e espécimes semelhantes eram de um T. rex adolescente, sugerindo que o famoso predador passava por um surto de crescimento extraordinário antes da vida adulta.
Descobertas posteriores — como a do fóssil “Jane”, encontrado em 2001 — reforçaram os dois lados da discussão. Mesmo assim, a hipótese do “rex adolescente” acabou se tornando a mais aceita.
O impasse se manteve porque nenhum dos espécimes menores havia atingido o crescimento completo, explicou Holtz. “Se o Nanotyrannus era realmente um animal separado, então onde estavam os adultos?”, questionou.
“Dinossauros duelistas” e a virada da pesquisa
O ponto de virada veio em 2006, quando paleontólogos descobriram em Montana os fósseis conhecidos como os “dinossauros duelistas”, adquiridos pelo Museu de Ciências Naturais da Carolina do Norte em 2020. Lá, o pequeno tiranossauro do par pôde ser estudado detalhadamente — o outro animal era um tricerátopo, cuja identidade nunca foi questionada.
Como a maioria dos pesquisadores, a Dra. Zanno acreditava inicialmente que o fóssil fosse de um T. rex jovem. Mas ela e seu colega James Napoli logo perceberam que poderiam estar diante de algo diferente.
Ao dissecarem os ossos dos membros para contar anéis de crescimento e analisarem as fusões espinhais e a anatomia, descobriram que o animal tinha 20 anos quando morreu — e já era quase um adulto maduro.
Diferenças marcantes em relação ao T. rex
Zanno e Napoli também analisaram mais de 200 fósseis de tiranossauros ao redor do mundo. A comparação revelou diferenças anatômicas claras: o espécime dos “dinossauros duelistas” tinha membros anteriores e mãos maiores, além de um terceiro dedo vestigial. O crânio possuía mais dentes e tomografias mostraram padrões distintos de nervos cranianos. A cauda, por sua vez, tinha menos vértebras.
“Para que ele se transformasse de um tiranossauro adolescente em um adulto, isso desafiaria tudo o que sabemos sobre o crescimento de vertebrados”, disse Zanno. “Simplesmente não faz sentido para um T. rex jovem.”
Segundo a equipe, o Nanotyrannus provavelmente pertence a um ramo primitivo da linhagem dos tiranossauros, que se separou há cerca de 100 milhões de anos, quando um mar interior dividiu a América do Norte em ilhas. O animal pode estar mais próximo dos tiranossauros da Costa Leste do que do próprio T. rex.
Implicações e ceticismo
“De uma forma muito concreta, esta descoberta derruba décadas de pesquisa sobre o crescimento e a biologia do Tyrannosaurus rex”, afirmou Zanno. O estudo desafia a ideia de que os tiranossauros mudavam radicalmente ao crescer e de que o T. rex era o único grande predador de seu ecossistema.
Os pesquisadores também encontraram indícios de que “Jane” — antes vista como uma T. rex jovem — seria, na verdade, outro exemplar do gênero Nanotyrannus, batizado de Nanotyrannus lethaeus.
Holtz, embora discorde de alguns detalhes, classificou a identificação do Nanotyrannus adulto como um “golpe decisivo”. Já Dave Hone, paleontólogo da Queen Mary University de Londres, avaliou que a descoberta “muda o equilíbrio das evidências”.
Thomas Carr, do Carthage College, defensor da teoria do “teen rex”, reconheceu que o artigo é “bastante conclusivo” ao identificar o espécime dos dinossauros duelistas, mas rejeitou a ideia de que “Jane” pertença a outra espécie. “Se todos os pequenos tiranossauros do oeste da América do Norte forem Nanotyrannus, então onde estão os T. rex juvenis? Essa parte da história não faz sentido”, afirmou.
Apesar das dúvidas remanescentes, Steve Brusatte, da Universidade de Edimburgo, destacou a importância da descoberta: “A grande revelação deste artigo é que o Nanotyrannus é real”.
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