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Lá no alto: conheça a cidade argentina a 3.400 metros de altitude que recebe apenas 22 turistas por vez

16/10/2025 07:02 O Globo - Rio/Política RJ

“Para chegar à cidade, primeiro é preciso tocar o céu”, diz Guillermo Quipildor, sentado na tranquila praça de San Francisco de Alfarcito, a 3.400 metros acima do nível do mar, no departamento de Cochinoca, em Jujuy, na Argentina. Apenas 80 habitantes vivem ali, junto com duas lhamas que vagam pelas ruas estreitas e íngremes. “Preferimos dizer que somos 25 famílias”, acrescenta. Eles concordaram em abrir a vila ao turismo, mas com uma condição: “Aceitamos apenas 22 pessoas”.
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O número não é um capricho. São as camas disponíveis nas três acomodações, incluindo a Pousada Comunitária La Hornada; duas famílias ocupam as outras duas casas. Na aldeia, reconhecem que o turismo é uma oportunidade de emprego, desde que os benefícios sejam distribuídos igualmente. Há dois refeitórios, mas nunca abertos simultaneamente: um funciona em um dia, o outro no seguinte.
“Não estamos interessados em enriquecer; queremos ser donos do nosso destino e ter o básico. O resto, que é tudo, vem da natureza”, diz Iber Sarapura. A limpeza da vila, a recepção aos turistas, preços das acomodações, alimentação e atividades são decididos em assembleia. Até as montanhas receberam nomes dados pelos moradores.
Paisagens que falam
Um dos morros se chama Maravilloso, outro Tres Pintores, e ao lado está El Negro, com destaque para o imponente Cerro Alfar, de 4.300 metros de altitude. A meia hora da cidade fica a Lagoa Guayatayoc. Seca na maior parte do ano, ela atinge até quatro metros de profundidade durante o verão, atraindo flamingos cor-de-rosa a essas latitudes esquecidas.
“Alfarcito é um oásis na Puna”, afirma Quipildor. Acima da vila, uma nascente distribui água pura por mangueiras precárias, protegendo cada casa como um tesouro. Localizada em um ponto de difícil acesso, a presença humana é rara; às vezes, apenas pequenas casas de adobe aparecem nas encostas, abrigando viajantes.
A viagem até Alfarcito, a partir da capital provincial, é por si só uma aventura. Seguindo a Rota 9 até a Rota 52, o visitante se depara com a beleza colorida da Puna, incluindo o Cerro de las Siete Colores em Purmamarca. A estrada desafia qualquer motorista na subida da Cuesta del Lipán, atravessando nuvens e alcançando 4.200 metros de altitude.
Tradição e comunidade
“Construímos conforme os ensinamentos de nossos avós”, diz Quipildor. A vila começou a se formar em 1880 e permanece quase inalterada, exceto pela eletricidade e conexões de internet, usadas principalmente para organizar reservas turísticas. As casas são de adobe, pedra e telhado de palha, com madeira de cardón e queñua, árvores raras e preciosas na Puna.
“Aqui não usamos a palavra 'um', é sempre 'nós'”, explica Sarapura. A Posada La Hornada, localizada na parte mais alta, é administrada por uma família diferente a cada mês, assim como os outros alojamentos, refeitórios e oficinas de artesanato. Todo o dinheiro arrecadado vai para manutenção, fundo comum e pagamento dos trabalhadores.
A praça é o ponto de encontro da comunidade. Casas e colinas, em tons ocres, se fundem à paisagem, enquanto a igreja se destaca em branco. Um forno de barro comunitário e bancos discretos reforçam a simplicidade e o estilo de vida local. À noite, o céu profundo revela um manto perfeito de estrelas.
A mercearia local oferece o básico: doces, salgadinhos, refrigerantes e cerveja Norte, além de cédulas de eleições passadas. Famílias transformam suas casas em salas de jantar, servindo sopas, ensopados e costeletas de lhama, com sobremesas simples, como flan ou frutas com doce de leite. Nos refeitórios Tres Hermanos e El Churcalito, Quipildor às vezes canta versos melancólicos, trazendo a música suave de Puno à mesa.
“É uma cidade perdida, que pouca gente conhece e que está congelada no tempo”, diz Ana Sainz, visitante de Buenos Aires, temendo que a vila se torne famosa demais. Seu roteiro inclui também as Salinas Grandes, a 40 quilômetros de distância, testemunhando a produção de sal e lembranças de jornadas antigas de mula. San Francisco de Alfarcito fica a 170 quilômetros de San Salvador de Jujuy.
O turismo começou há 25 anos, financiado pela Xunta de Galicia, com materiais da Europa e mão de obra local. A vila decidiu abrir suas portas mantendo assembleias comunitárias e respeitando ritmos naturais e tradições centenárias.
“Queremos ser donos do nosso destino. Não negociamos nossa liberdade”, afirma Sarapura. Para visitantes como Sainz, a vida ali passa em câmera lenta, permitindo aproveitar o silêncio, o céu e o dia sem distrações digitais.
Antes do nascer do sol, fumaça sobe das casas. Fornos de barro assam tortilhas e pão, enquanto turistas tomam café com infusões de ervas locais, como muña muña e popusa. Não há farmácias ou celular; as tarefas diárias incluem pastorear gado, colher folhas, raízes e cuidar das p

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