
Chef paraense se recusa a cozinhar para príncipe William após pedido de menu 100% vegano: 'Medo e preconceito'
Não se sabe se a ordem veio do próprio príncipe William ou da equipe de assessores brasileiros que atuarão como cicerones do representante da monarquia britânica em solo tupiniquim. Fato é que não poderá haver nenhum ingrediente de origem animal — nem carne, nem leite, nem queijo — no jantar que será oferecido ao príncipe de Gales, no dia 5 de novembro, no Rio de Janeiro, durante o Earthshot Prize 2025, premiação dedicada à causa ambiental e criada pelo filho da princesa Diana. Justamente por isso, Saulo Jennings, o celebrado chef paraense que cozinharia para os 700 convidados do evento, decidiu pular fora da empreitada.
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Para início de conversa, o profissional esclarece que não tem nada contra o veganismo. Ele entende e respeita o movimento — tanto que o restaurante que comanda, a Casa do Saulo, foi o primeiro estabelecimento de Belém (PA) a incluir no menu pratos sem carne. O cozinheiro só não consegue acreditar que todos os convidados da premiação sejam adeptos de uma dieta 100% vegana. E mais. Na visão do chef, não faz sentido ser contratado para apresentar a culinária amazônica, e logo para uma turma de gringos, sem poder utilizar um dos principais ingredientes locais.
— Os britânicos vêm da terra do "fish and chips" e agora não comem peixe? Pegou mal essa determinação — avalia Saulo. — A meu ver, pelo que tenho visto de várias delegações que estarão na COP30, eles têm medo e um certo preconceito da nossa comida. Às vezes não é nem porque a pessoa seja vegana. É receio mesmo! Este é o meu sentimento como chef. Não estou dizendo que este é o caso deles (dos britânicos e do príncipe). Mas pelas propostas de trabalho que tenho recebido para a COP, escuto muitas coisas assim: "Ah, faz só uns sanduichinhos com peito de frango", já me pediram recentemente. Respondo que faço lombo de pirarucu. Esta é a minha cozinha.
Saulo sugeriu aos organizadores, de forma insistente, que pelo menos 10% ou 20% do cardápio contivessem iguarias com peixe, uma de suas especialidades. As negociações foram longas. A resolução final, porém, foi por um menu exclusivamente à base de vegetais. Detalhe: em 2023, Saulo encantou o paladar do Rei Charles III — na função de chef da festa que antecedeu a coroação do monarca, no Palácio de Buckingham, na Inglaterra — ao preparar arroz de pato com tucupi, peixe com musseline de macaxeira e cordeiro temperado com ervas amazônicas .
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Aliás, um dos pratos mais pedidos no restaurante do chef — que tem filiais no Museu do Amanhã, na capital fluminense, e no Edifício Boulevard Sul, na Vila Olímpia, em São Paulo — foi especialmente criado diante do Rei Charles III. Trata-se da "feijoqueca", um misto de feijoada e moqueca, preparado com feijão-fradinho de Santarém, peixe, camarão, jambu e perfume de pimenta-comari. Um must.
— Não acho que é sobre saber ou não cozinhar de maneira 100% vegana — reforça o cozinheiro, ao comentar a decisão por abandonar a labuta desta vez. — É sobre missão! No meu caso, tenho um propósito, que é levar a culinária da Amazônia onde eu puder. E a culinária da Amazônia é tudo o que vem dos rios e da floresta, incluindo o peixe. Tentei, ao máximo, uma negociação. Mas não rolou.
Filé de pirarucu grelhado com molho de castanha-do-pará, banana-da-terra e camarão-rosa: prato no cardápio do restaurante Casa do Saulo
Fábio Rossi/Agência O Globo
Quem assume o posto, em substituição a Saulo, é a chef carioca Tati Lund, dona do Org Bistrô, no Rio de Janeiro, que serve apenas pratos sem carne. A casa foi eleita como o terceiro melhor restaurante vegetariano em solo carioca, neste ano, pelo Prêmio Rio Show de Gastronomia.
— Eu me preocupo de a classe vegana achar que estou criticando o veganismo. Não é isso! Sou de uma culinária de inclusão — frisa Saulo, conhecido por ser um entusiasta máximo de ingredientes nacionais. — Dias desses, me encontraram num restaurante português e me questionaram: "Ah, você come bacalhau?" Claro que como! Não estou dizendo que não é para comer bacalhau. É para comer bacalhau, mas também é para comer pirarucu. Não sou de exclusão.
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