
'Caso zero': Terceiro episódio expõe 'desfechos distintos e conflitantes' da morte de menino
Ao longo de cinco episódios semanais do podcast "Caso zero", a colunista Bela Megale e o jornalista André Borges mergulham na história que mudou o rumo dos transplantes no país. Em 2000, a morte do menino Paulo Veronesi Pavesi, de 10 anos, em Poços de Caldas (MG), desencadeou a denúncia de que haveria uma máfia liderada por médicos da cidade. Três dos cinco episódios já estão no ar, e os últimos capítulos serão divulgados nas próximas duas semanas. De acordo com Bela Megale, que investiga o caso ao lado de André desde 2023, o terceiro episódio expõe "uma contradição profunda" sobre a morte da criança.
'Caso zero': veja os documentos citados no podcast que investiga acusação de máfia dos transplantes
Ouça os três primeiros episódios: História teve início há 25 anos
Para o Ministério Público Federal, os médicos do primeiro hospital que recebeu o menino após o acidente, o Pedro Sanches, teriam agido para que ele morresse e, a partir de sua morte, fosse transformado em doador de órgãos. A acusação que recai sobre os médicos do Pedro Saches é de homicídio, já que ele teria morrido neste hospital. Por isso, o julgamento dos médicos foi feito por um tribunal de júri, em que um grupo de pessoas comuns dão o veredito sobre o caso.
Já para o juiz Narciso Alvarenga, que passaria a julgar a denúncia, Paulinho não teria morrido no hospital Pedro Sanches, mas sim no segundo hospital, a Santa Casa de Misericórdia, para onde ele foi encaminhado para fazer uma segunda arteriografia. Na visão do juiz, o menino teria chegado vivo até a Santa Casa, e sua morte teria sido consequência da retirada de seus órgãos.
Nesta segunda versão, a acusação não foi de homicídio, mas de infração à Lei dos Transplantes. Para o juiz, os médicos da Santa Casa teriam levado o menino à morte, ao retirarem seus órgãos. Nesta acusação, a sentença não é dada pelo tribunal de júri, mas pelo próprio juiz.
— O que mostramos aqui é que são dois desfechos distintos e conflitantes, pelo fato de não ter como alguém morrer duas vezes. Mesmo assim, as duas sentenças seguiram adiante, de forma paralela, acusando os dois grupos de médicos — diz Bela Megale.
Narciso Alvarenga entrou no caso mais de dez anos depois do acidente, ao assumir a Vara Criminal de Poços de Caldas. Ele se mudou de Belo Horizonte para a cidade do sul de Minas em 2011 e sua chegada representou uma reviravolta no processo. O magistrado atendeu a um pedido do Ministério Público Estadual de Minas Gerais, que fez um aditamento na denúncia que tornou mais três médicos réus no caso de Paulinho Pavesi. Todos trabalhavam na Santa Casa de Misericórdia.
No terceiro episódio, Narciso Alvarenga explica por que batizou a processo sobre a morte de Paulinho Pavesi de “Caso Zero” e relata que outras investigações foram abertas envolvendo casos de transplantes feitos na Santa Casa. Em fevereiro de 2014, quase 14 anos depois do acidente, Alvarenga condenou os três médicos que participaram da cirurgia de retirada dos órgãos do Paulinho, na Santa Casa, e eles foram enviados para o presídio de Poços de Caldas.
Episódios
Os três primeiros episódios já estão disponíveis e podem ser ouvidos abaixo. Os outros dois serão lançados nas próximas segundas-feiras. "Caso zero" também pode ser acompanhado nas principais plataformas de áudio, como Apple e Spotify. O episódio 3 também explora o alcance político que o caso ganhou no Congresso Nacional, com a instauração de uma CPI em abril de 2004, quatro anos depois do acidente.
Entenda o caso complexo
Em 19 de abril de 2000, o menino Paulo Veronesi Pavesi escorregou do parapeito do playground do prédio onde vivia com a família e caiu de uma altura de cerca de 10 metros. Paulinho, como era chamado, foi socorrido no hospital particular Pedro Sanches, onde passou por uma cirurgia no crânio. Apesar das tentativas para salvá-lo, o menino não resistiu e teve morte cerebral, sendo mantido por aparelhos.
Dois dias depois, ele foi encaminhado para a Santa Casa de Poços de Caldas, e os pais autorizaram a doação de seus órgãos. Passados alguns meses, o pai da criança, Paulo Airton Pavesi, recebeu uma cobrança de mais de R$ 11 mil, hoje equivalente a mais de R$ 50 mil, do Pedro Sanches. O hospital se negou a rever o valor e, sem obter o pagamento, pediu a falência da empresa de Pavesi. Ele foi até a Associação Brasileira de Transplante de Órgãos para reclamar da situação, que ganhou o noticiário nacional.
O Ministério Público Federal de Minas passou a investigar e apontou, além da cobrança irregular, a atuação de uma suposta organização criminosa em Poços de Caldas, que lucraria com o transplante ilegal de órgãos, burlando a lista oficial do SUS.
Entenda: Podcast tem episódios lançados semanalmente e é investigado por jornalistas há dois anos
Foram encontradas falhas nos procedimentos de registros de morte e de transplante de órgãos de Paulinho, e os médicos foram acusados de forjar laudos sobre a morte cerebral do menino para retirar seus órgãos. O hospital Pedro Sanches acabou
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