
'Caso zero': a transcrição do segundo episódio
Produzido pelo jornal O GLOBO, o podcast "Caso zero" investiga um dos acontecimentos mais controversos envolvendo transplantes de órgãos no Brasil. Ao longo de cinco episódios, os jornalistas Bela Megale e André Borges mergulham na história que mudou o rumo dos transplantes no país.
Ouça o 'Caso zero': Podcast está disponível nas principais plataformas de áudio
Produção do 'Caso zero': Apuração levou dois anos e traz novos detalhes e entrevistas inéditas
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"Caso zero" também pode ser ouvido nas principais plataformas de áudio, como Apple e Spotify.
Abaixo, a transcrição do segundo episódio:
André Borges: Caso Zero é uma série de podcast em cinco episódios. Esse é o segundo episódio da série. Se você ainda não escutou o primeiro, a gente recomenda que você pause aqui e escute antes o episódio anterior.
Sonora de Paulo Pavesi: Olha o sistema que eu tô vendo. O sistema é podre, os caras não vão beneficiar quem precisa. Eles estão defendendo tudo isso porque eles são traficantes, eles vendem órgãos, eles matam pessoas em UTI. Essa é a realidade.
Bela Megale: Paulo Pavesi e sua esposa Rosângela perderam o filho Paulinho após um acidente no dia 19 de abril de 2000. Os órgãos do menino foram doados e Paveze homenageou os médicos Álvaro Inhanez, José Luiz Gomes e José Luiz Bonfitto com uma placa de prata, em agradecimento pelos cuidados com o menino. O texto escrito na placa dizia que — abre aspas — “no momento mais difícil de nossas vidas, seu gesto humano e profissional nos deu segurança e conforto para seguirmos em frente” — fecha aspas. Mas, em pouco tempo, Pavesi passaria a acusar esses mesmos médicos de terem matado seu filho.
Bela Megale: Eu sou Bela Megale.
André Borges: E eu sou André Borges.
Bela Megale: E esse é o "Caso zero": a história que mudou o rumo do transplante de órgãos no Brasil. Um podcast do jornal O GLOBO. Segundo episódio: A acusação.
André Borges: Uma das fontes que a gente usou para fazer a apuração foi o livro que o Paulo Pavesi escreveu sobre o caso. Ele se chama "Tráfico de órgãos no Brasil: O que a máfia não quer que você saiba". Nesse livro, o Pavesi narra toda a sua jornada atrás do que ele considera ser a justiça — e que ele vem repetindo ao longo desses últimos anos, em entrevistas, podcasts, lives e em depoimentos para a Justiça. Uma parte importante da nossa apuração partiu dos relatos do próprio Pavesi , mas não só disso: nosso fio condutor também passa por centenas de documentos, denúncias de procuradores, dezenas de entrevistas com os envolvidos e milhares de páginas de processos judiciais. É uma forma de tentar olhar o caso sem um envolvimento emocional. A gente sabe que revisitar a história de uma criança que morreu aos dez anos de idade em um acidente trágico toca qualquer pessoa. O nosso esforço aqui é entender a amplitude do que aconteceu com distanciamento, fazendo a nossa própria apuração.
Bela Megale: Paulo Pavesi conta que, alguns dias depois da morte do filho, ele voltou ao Hospital Pedro Sanches para pagar a conta da internação. Relembrando: o Pedro Sanches foi o primeiro hospital para onde o Paulinho foi levado depois do acidente, aquele que ficava perto da sua casa. O Pedro Sanches era uma clínica particular. Ele era até cadastrado pelo SUS, mas a maior parte dos seus serviços era por atendimento privado. Paulinho foi internado como paciente particular e, depois de sua morte, os pais ainda tinham uma conta para pagar.
André Borges: Paulo Pavesi diz que, quando ele chegou no hospital, Pedro Sanches entregou uma conta da internação, e ele ficou assustado com o valor. A conta era de R$ 11.668,02. Se a gente atualizar esse valor para 2025, seria o equivalente a mais de R$ 51.000. O Pavesi tinha acabado de perder o filho e, agora, tinha que lidar com uma conta hospitalar altíssima, que precisava ser paga naquele instante.
Bela Megale: Porque, segundo ele relata, naquele momento o hospital o obrigou a pagar a conta. Caso contrário, o cheque caução que uma amiga da família emitiu ia ser descontado. Por isso, Paulo Pavesi substitui o cheque da vizinha por um cheque seu, da sua empresa, no valor total da conta do hospital.
André Borges: Tudo estava prestes a mudar radicalmente. Assim que Pavesi deixou o hospital e chegou em sua casa, ele começou a analisar a conta. Queria entender por que o valor era tão alto. E foi ali que teve início a saga do pai contra os médicos envolvidos com o atendimento de seu filho. Eu vou ler aqui o relato que o Paulo Pavesi faz desse momento em seu livro — abre aspas: “Nossa situação financeira ainda não havia se estabilizado totalmente. Havíamos passado por momentos difíceis e estávamos nos recuperando pouco a pouco. Eu precisaria achar alguma alternativa para fazer aquele pagamento, mas precisava de tempo. Rosângela, ao saber do débito, ficou muito preocupada. Verificando os detalhes da conta superficialmente, surgiram algumas dúvidas. Coloquei a conta na mesa da sala, puxei uma cadeira e me debrucei para entender o que havia sido cobrad
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