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Aterros do Rio: ao avançar sobre o oceano, o Rio perdeu 56 praias desde o século XX

18/10/2025 07:31 O Globo - Rio/Política RJ

São poucas as metrópoles que desenvolveram relação com o mar tão ancorada no lazer. Nesse quesito, o Rio nada de braçada, mas a conexão já teve chances de ser ainda maior e mais democrática. As opções praianas, que hoje se concentram basicamente no eixo das zonas Sul e Sudoeste, já foram mais amplas. E os aterros — sem falar na criminosa omissão histórica com a qualidade das águas da Baía de Guanabara — têm papel importante nesse desequilíbrio.
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É verdade que a cidade ganhou terras importantes graças ao aterramento, mas também perdeu muitas belezas. Das 118 praias cariocas existentes no início do século XX, quase a metade desapareceu: 56 simplesmente sumiram do mapa, principalmente na Zona Norte, e de forma mais acelerada a partir dos anos 1950. Não para por aí. Na Baía de Guanabara, muitas ilhas também acabaram cercadas de terra por todos os lados. Das cem que havia, restaram 65: as outras foram engolidas por aterros.
Centro sem praia
A conta é do geógrafo Jorge Luiz Barbosa, um dos autores do livro “As águas encantadas da Baía de Guanabara” (Numa Editora), que, entre outros aspectos, trata do crescimento da cidade por meio de aterros.
A mesma Igreja de Santa Luzia (abaixo à direita) em 2025. O mar ficou a 750 metros de distância
Custódio Coimbra
— Os aterros tiveram funções distintas na urbanização do Rio, que se refletem até hoje. O que ocorreu ao longo dos anos foi uma espécie de racismo ambiental. Os aterros feitos em direção à Zona Sul, seja no Parque do Flamengo, seja na Lagoa e nas demais praias da Zona Sul, tiveram como objetivo valorizar a paisagem e as moradias de uma classe social mais favorecida. Por outro lado, a Zona Norte foi sacrificada, com o aterramento de praias entre o Caju e a Penha — diz o autor.
O apagamento da orla também é observado na região central da cidade. A Igreja de Santa Luzia, no Castelo, é um marco desse processo. O templo, cuja construção foi iniciada em 1752, ficava à beira da extinta Praia de Santa Luzia. Hoje, se fosse possível caminhar em linha reta saindo de sua porta principal, seria preciso vencer uma distância de quase 750 metros para molhar os pés na água do mar.
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Tanto a Praia de Santa Luzia quanto sua vizinha, a Praia das Virtudes, fizeram sucesso entre banhistas pioneiros que desfrutaram os prazeres e as qualidades terapêuticas do banho de mar entre o fim do século XIX e as primeiras décadas do século XX. A fama local durou relativamente pouco: a partir da década de 1930, as duas já tinham desaparecido, como parte de um “tsunami” na contramão: da Glória até a região do mangue, perto da atual rodoviária do Rio, muitas outras tiveram o mesmo destino: Praia do Russel, Praia da Glória, Praia da Ajuda (ou da Lapa, em frente à também extinta Lagoa do Boqueirão), Praia de Dom Manoel, Praia do Peixe, Praia dos Mineiros, Pedra da Prainha, Praia do Valongo, Gamboa e Praia Formosa.
No livro, Jorge Luiz Barbosa e seus colegas Diogo Cunha e Ana Thereza de Andrade Barbosa citam ainda um estudo do geógrafo e ambientalista Elmo Amador, falecido em 2010, sobre como era a paisagem do Rio em 1500. Nos tempos do descobrimento, as imediações de onde seria construída a Igreja da Penha, por exemplo, ficavam à beira-mar.
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Jorge Luiz observa que os aterros apagaram boa parte da cultura suburbana em sua relação com mar. Até os anos 1950, os esportes náuticos eram praticados naturalmente nas praias locais. O Olaria, por exemplo, um dos mais tradicionais clubes de futebol do subúrbio, tem em seu escudo um remo e um timão. Na década de 1920, a agremiação criou uma divisão náutica para realizar regatas na Praia de Maria Angu, entre a Penha e Inhaúma, aterrada a partir dos anos 1950 para a abertura da Avenida Brasil. Degradação ambiental e mais aterros também acabaram com a tradição do banho de mar à fantasia durante o carnaval, na Praia de Ramos.
— Hoje, se investe muito tempo e dinheiro para conter enchentes na cidade. Se observar bem, várias áreas onde existem problemas (como nas proximidades de Irajá e Acari) são áreas que foram aterradas. Ou seja, áreas naturais de drenagem foram cobertas e os problemas foram surgindo nos anos seguintes com novas construções, que reduziram ainda mais a permeabilidade do solo — avalia Jorge Luiz.
Vista Aérea da Ilha do Pinheiro em abril de 1938: cerca de água por todos os lados Escola de Aviação Militar - Museu Aeroespacial
Escola de Aviação Militar / Museu Aeroespacial
Ilhas perdidas
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