Após bônus de R$ 1 mil, GCM apreende oito vezes mais motos por semana em São Paulo
A lei municipal que bonifica a Guarda Civil Metropolitana (GCM) de São Paulo pela apreensão de motocicletas roubadas ou adulteradas ainda não completou 50 dias em vigor, mas já provocou um aumento de oito vezes no número de veículos capturados por semana pelos agentes de segurança. O resultado é celebrado pela gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB), mas a recompensa, de R$ 1.000 por moto capturada, também provoca críticas de especialistas em segurança pública.
De acordo com dados da Secretaria Municipal de Segurança Urbana (SMSU), entre janeiro e agosto deste ano, antes de a medida entrar em vigor, a GCM havia apreendido 241 motos — uma média de cerca de 7 motos por semana. Desde a sanção do projeto, em 3 de setembro, até esta quarta-feira, 20, o número de apreensões chegou a 434 veículos. Ou seja, a GCM apreendeu cerca de 62 motos por semana, oito vezes a média anterior.
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Desse total, 395 motos eram registradas como furtadas, roubadas ou adulteradas. Segundo a secretaria, 367 agentes foram contemplados com a bonificação, com um pagamento total de R$ 199,5 mil.
Enquanto aguarda dados do governo estadual para medir o impacto da medida na prevenção de crimes, a prefeitura avalia como positivo o resultado inicial do programa. Especialistas, por outro lado, questionam a eficácia da bonificação e os efeitos que ela pode gerar sobre a atuação da guarda a longo prazo.
A premiação foi proposta pelo prefeito Ricardo Nunes (MDB) e enviada à Câmara Municipal em meados deste ano. A justificativa da gestão municipal e da base do prefeito é que a maioria dos assaltos realizados na cidade é cometida por criminosos utilizando motocicletas, daí a necessidade de mirar nessa “ferramenta de trabalho” dos infratores.
O bônus é concedido mediante a comprovação da participação dos GCMs na recuperação do veículo. O processo inclui a elaboração de um boletim de ocorrência e um relatório assinado pelos participantes. O valor pode ser concedido individualmente ou dividido entre a equipe responsável pela operação.
— O prefeito Ricardo Nunes acerta ao criar um programa de estímulo e motivação para os nossos policiais municipais, que tiram de circulação motos roubadas e adulteradas, principalmente as que estão na posse de criminosos. Ter esse volume de motos que poderiam estar sendo utilizadas para o crime e prejudicando as vítimas que perderam os veículos é um prejuízo incalculável sob o aspecto da sensação de segurança da cidade — disse o secretário municipal de Segurança Urbana, Orlando Morando.
O titular da pasta argumentou que, assim como na iniciativa privada, incorporar programas de incentivo por produtividade apresenta resultados satisfatórios. Sobre o aumento expressivo das apreensões, Morando afirmou que, além do bônus, a GCM recebeu a diretriz de intensificar ações de fiscalização de motos, e que a gestão não vê o pagamento como um peso para o orçamento.
— Falei com o prefeito sobre esse aumento (de gasto) e ele disse: 'isso não tem preço [...] quanto custa uma vida?'. Isso é um investimento, não é uma despesa. É mais um investimento que a prefeitura tem feito em prol da redução da violência na cidade — afirmou.
Apesar da visão otimista, especialistas apontam um possível desequilíbrio na atuação dos agentes, já que o trabalho poderia se voltar à busca pela premiação.
— Pergunte ao efetivo da Guarda Municipal quem quer ficar em Pinheiros, fazendo presença de forças de segurança para evitar criminosos de quebrarem vidros e roubarem carros, e quem quer ficar fazendo blitz e bloqueios para pegar motos. Essa é a nossa preocupação quando vemos a prefeitura fazendo esse tipo de investimento — argumenta. Fernando Capano, doutor em Direito do Estado pela Universidade de São Paulo (USP).
Ao defender o reforço dos vencimentos dos agentes de segurança, o advogado ponderou que, enquanto a iniciativa privada se rege por uma perspectiva de lucro, quem trabalha na administração pública está submetido a outro conjunto de valores.
Cobras na Índia e 'lei faroeste'
Em artigo, Capano apontou problemas como desvio de finalidade, manipulação de dados e corrupção, além de questionar o precedente ético criado ao atrelar dinheiro público à produtividade policial. Um exemplo citado por ele foi o chamado “efeito cobra”.
A expressão surgiu na Índia colonial, quando o governo britânico decidiu pagar recompensas por cobras venenosas mortas. Com o incentivo, moradores passaram a criá-las apenas para matá-las e vendê-las. Quando o governo se deu conta da situação, cancelou o programa, levando os criadores a libertar os répteis, agravando a crise.
Outro paralelo citado por Capano é a “gratificação faroeste”, adotada informalmente no Rio de Janeiro nos anos 1990. Policiais militares que apresentavam altos números de confrontos letais recebiam gratificações ou promoções. “M
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