Logo
Tudo que você precisa saber sobre as eleições em um só lugar

Guerra da Amazônia e outros contos

18/10/2025 19:00 Imirante - Política

<p>[media :type="fotolegenda" :ref="805619" :title=" " /]</p><p>Ao ler os contos deste livro de Valmir Seguins, o leitor comum (aquele que compra o livro somente pelo prazer da leitura) jamais se pergunta se aquilo que está lendo é realidade ou ficção. </p><p>Sim, porque para ele não interessa se o fato descrito aconteceu de verdade, pois, seduzido pela narrativa, está mais envolvido em chegar ao final da história o quanto antes para desvendar o que o encadeamento dos acontecimentos lhe reserva de misterioso ou pitoresco, eis que, desde o primeiro conto lido, sabe que o autor lhe reserva algo desse tipo. Em suma, o leitor não está interessado na fidedignidade dos fatos porque ele segue motivado apenas pelo prazer de ler, no afã de consumir palavra por palavra, vírgula por vírgula, um conteúdo que lhe faz sorrir, refletir, ou recordar algo parecido com o que já presenciou ou viveu. </p><p>Ao ler esses mesmos contos o leitor de perfil mais literário ou acadêmico (aquele que exerce a leitura, também por um dever de ofício e que, portanto, adquiriu intuitivamente a inclinação investigativa de perscrutar o que está se passando nas entrelinhas entre o autor, o narrador e os personagens de sua criação), aquele que tanto pode ser um mestre em literatura, um praticante de jornalismo literário, um resenhista ou um bom escritor, também a ele, jamais ocorre se perguntar, pelo menos enquanto estiver lendo, onde começa a realidade e termina a ficção ou vice-versa. </p><p>Sim, porque também ele foi seduzido pelos artifícios usados pelo autor Valmir Seguins que arrebataram o leitor comum, acima. Ou seja, histórias sempre interessantes e factíveis, por mais bizarros que possam parecer certos elementos do ambiente, picantes e, na maioria das vezes, divertidos, escudados por descrições minuciosas da geografia do local com riqueza de detalhes, tornando-as íntimas para o leitor. Inclusive as siglas de instituições ou organismos governamentais, que saltam da descrição dos fatos como se extraídas do profundo poço da memória de cada um, ainda ressoando familiares, trazidas do passado e incorporando-se aos personagens descritos. </p><p>Teriam sido reais? Mas, que isso interessa, de fato? Talvez seja uma artimanha do autor para dar credibilidade ao que está sendo narrado ou não, mas isso pouco importa para o leitor, seja qual for o seu <i>tipo</i>. O que interessa é que a arquitetura da narrativa se tornou de somenos diante da simplicidade e da objetividade do enredo; que vai direto ao ponto para, assim, primeiro granjear a atenção do leitor e, depois, conduzi-lo à epifania final. Como um prédio bonito, diante de cuja visão impactante o transeunte se detêm para apreciar, mas a quem jamais ocorre indagar como o arquiteto fez para chegar a um monumento artístico. </p><p>Pois é isso que distingue os contos deste livro: histórias bem contadas que arrebatam o leitor por caminhos pitorescos, curiosos e humanos, próprios da vida comum. Os personagens do autor, portanto, não são de natureza heroica, são apenas humanos, demasiadamente humanos, como disse o filósofo. Como, por exemplo, esse impactante e imprevisível personagem chamado <i>Coisinha</i> do conto com esse título: um magnífico representante dessa coisa abrangente e heroica chamada de ser humano. </p><p>Já foi dito que a tarefa do romancista é chamar as coisas pelo devido nome antes de transformá-las em símbolos, o que parece um ótimo conselho a escritores interessados em criar algo como “a ilusão da realidade. ”</p><p>Percebe-se, de pronto, que o autor Valmir Seguins não está interessado nisso, embora possa estar fazendo isso, porque está pouco preocupado com a teoria literária. Ele quer simplesmente contar uma boa história explorando a riqueza humana de personagens como Coisinha, do conto com esse título, como o bêbado contumaz de <i>O bêbado perdido</i>, como o intrigado descobridor Anacleto de <i>As tamboeiras de milho de Vaca Velha, </i>como a maliciosa Aline do conto <i>Aline</i> etc. Assim como nos mil episódios de <i>Decamerão </i>que fez a glória de Giovanni Boccacio, são histórias talvez contadas para o autor ou que ele viveu ou que imaginou, já que, como todo escritor atento ele tem asas para imaginá-las ou enriquecê-las. Sendo um precioso observador e tendo afinidade com o “humano” como tinha o escritor italiano, é um pescador das riquezas cotidianas que concedem àquele que as interpreta e as propaga, a fortuna do dom de <i>Deus das pequenas coisas</i>, (se me permitem recorrer ao belo título do romance da indiana Arundhati Roy) </p><p>Se Oscar Wilde um dia disse que a realidade imita a ficção muito mais que o vice-versa, estar no limiar dessa ambiguidade praticando o ofício

Fonte original: abrir