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'Ele podia estar preso, pagando pelos erros dele. Mas devia estar vivo’: mãe de morto na megaoperação conta que família pediu para ele não ir para confronto

02/11/2025 11:00 O Globo - Rio/Política RJ

Em relato feito ao GLOBO, a mãe de Kauan de Souza conta que seu filho começou dirigindo para o tráfico há três meses. Ela diz que, quando menino, Kauan sonhava em ser bombeiro, e depois chegou a trabalhar com o pai num ferro-velho
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“Meu menino, Kauan de Souza, tinha acabado de completar 18 anos. Na madrugada daquela terça-feira, chamaram ele uma hora da manhã para ir ‘ficar a postos’. O padrasto dele falou: ‘Não vai, Kauan. Fica em casa, não entra na mata’. Mas ele foi. Horas depois, assim que liberaram, fui para a mata atrás dele, gritando, chamando: ‘Kauan! Pode sair da mata, mamãe tá aqui! Já pode sair!’. Toda vez que eu via um corpo, achava que podia ser ele. Toda vez que eu via alguém de camisa preta — a roupa que ele usava na última vez que vi — meu coração disparava. Era como se eu ainda tivesse esperança de que ele fosse aparecer, escondido, esperando ajuda. Mas ele não apareceu.
Kauan de Souza
Reprodução
Ali, como mãe de criação dele, eu senti que ele não estava desaparecido, estava morto.
Kauan foi criado por mim desde pequeno, como um filho mesmo. Trabalhava com o pai num ferro-velho e sonhava em ser bombeiro e conquistar o carro dele. Era um menino bom e medroso. Tinha depressão e ansiedade. Ele me ligava toda noite só para dizer que me amava. Mas, há uns três meses, ele começou a se afastar de casa.
Começou dirigindo
Tudo começou quando os meninos da comunidade descobriram que ele sabia dirigir. Aprendeu com 13 anos, dirigia melhor que muito adulto. Chamavam ele para levar o carro, fazer os ‘corres’. Assim, ele foi entrando, aos poucos, sem arma, só dirigindo.
Ele achava bonito estar no meio deles, chegar nos bailes funk ao lado deles de cabeça erguida, com a roupa mais bonita e a garota mais bonita do lado.
Eu dizia para ele: ‘Sai dessa vida, meu filho, isso não é para você. Você teve tudo, você sempre mamou leite Ninho com Mucilon na mamadeira’. Mas ele achava que aquilo era respeito. Que só assim iam olhar para ele. Ele se envolveu por influência, por se sentir pertencendo a algum lugar.
E eu tenho certeza: se ele tivesse sido preso, nunca mais voltava para o crime. Ia ser um susto que ia fazer ele se arrepender. Conheço o meu filho.
Na sexta-feira, depois de dois dias na porta do IML, reconheci o corpo. Era ele. Meu menino, aquele que falava que só queria ser visto. Queria ser alguém ‘importante’. Meu filho podia estar preso, podia estar pagando pelos erros dele. Mas devia estar vivo”.
*Em depoimento à repórter Anna Bustamante

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