Shakira, Lily Allen, Taylor Swift: 'exposed' da vida íntima é cada vez maior nos álbuns pop
Não houve fofoca maior em 1953 do que a separação turbulenta entre Frank Sinatra e Ava Gardner. Foi um novelão descomunal, com episódios sórdidos descritos detalhadamente pelos jornais. Num deles, Gardner teria traído Sinatra com um toureiro na Espanha. Asfixiado com o peso de uma galhada ibérica, ele teria tentado até o suicídio. Mas o homem sobreviveu, e jogou no mundo, em 1955, o prostrado “In the wee small hours”, considerado por muitos o primeiro álbum conceitual da história fonográfica. Isso porque, diferentemente do que se fazia, todas as 16 faixas versavam sobre um mesmo tema, direta ou indiretamente: a dor de uma separação. Setenta anos depois, a cantora britânica Lily Allen vem causando furor com “West End girl”, um disco biográfico que, quase como um diário, também se debruça na melancolia — e no livramento, ela parece indicar— de seu divórcio com o ator David Harbour, o Hopper de “Stranger Things”. A fossa sempre foi pop, dizem especialistas. Lavar roupa suja, também.
‘Não era tão explícito’
Entre Sinatra e Allen, há vários outros casos notórios, e cada vez mais frequentes. Em março do ano passado, por exemplo, Shakira, a grande estrela colombiana, também desdobrou as agruras do fim do seu casamento com o jogador de futebol Gerard Piqué no seu 12º álbum, “Las mujeres ya no lloran”, gerando repercussão internacional. Bem antes dela, Phill Collins fez “Face value” (1981), seu primeiro disco solo depois de deixar a banda Genesis, quando foi largado pela mulher. Considerado por muita gente o melhor álbum de Bob Dylan, “Blood on the tracks”, de 1975, teria como pano de fundo o fim de seu casamento com Sara Dylan. “Eu tive que deixá-la por minha saúde”, diz Marvin Gaye em “When did you stop loving me, when did I stop loving you”, uma das faixas de “Here, my dear”, álbum assumidamente feito sobre sua ex, Anna.
— Os discos sobre fim de relacionamentos são razoavelmente comuns na cultura pop — diz Thiago Soares, professor da Universidade Federal de Pernambuco e pesquisador de cultura pop. — No início dos anos 2010, Adele se consagrou com o álbum “21”, que também é sobre separação. Isso vai alçá-la a um outro patamar dentro da indústria. Ela tinha feito um bom disco antes, o “19”, mas me parece que o ingrediente da separação alçou o “21” ao status de icônico, é um dos grandes best selling álbuns da história da música, e isso parece estar muito enraizado nesse ingrediente que é a coisa da separação.
Shakira no Engenhão no início da turnê Las Mujeres Ya No Lloran
Divulgação/Kevin Mazur/Getty Images for Live Nation
Para Felipe Vassão, produtor musical e compositor de hits feitos em parceria com nomes como Emicida, o pop atual é uma extensão da vida pessoal dos artistas, “mas não era tão explícito como a gente tem hoje”, ele afirma.
— Eu acho que a saída para artistas que querem fazer obras mais duradoras acaba sendo essa de se expor, colocar suas vidas para todo mundo ver. E não sei se é muito saudável, mas é o que a gente está vivenciando hoje.
Cantora nega vingança
Em “West End girl”, Lily fala abertamente sobre traição e um suposto vício em sexo por parte do marido, entre outros temas sensíveis e íntimos, como sua busca por refúgio na bebida e nos remédios, e sobre a relutância em aceitar um relacionamento aberto. “É o relato picante de um casamento em que o marido trai e manipula a mulher sistematicamente”, classificou o New York Times. Em entrevista recente à revista Interview, Allen disse que não se tratava de uma vingança. “Não sinto que estou sendo má. Eram apenas os sentimentos que eu estava processando”, afirmou a cantora de 40 anos.
O desabafo de Lily Allen está vendendo bem. Lançado na última semana de outubro, “West End girl” estreou na quarta posição na parada britânica. O número de streams no Spotify dobrou na semana seguinte ao lançamento, com a faixa-título registrando 7,5 milhões de streams em apenas 24 horas.
— O disco está sendo muito aclamado, justamente por essa característica — diz Soares, que vai além no fenômeno. — Existe o que eu chamo de cultura de especulação. Que é quando o fã cria especulações, conjecturas, e isso é muito aderente para a mobilização das redes digitais. No caso da Lily Allen, ela assume que é para o ex, e aí se constrói uma série de especulações em torno de que ambientes aconteceram aquelas ações — completa.
Todos os amores de Taylor Swift
Grande estrela de sua geração, Taylor Swift se notabilizou por colocar nas suas letras, com frequência, ainda que com discrição, indiretas sobre eventuais decepções amorosas ou términos mal resolvidos.
— Talvez ela seja o grande ícone dessa dinâmica de especulação — diz Thiago Soares. — “All too well”, por exemplo, ao que tudo indica, é sobre um relacionamento que ela teve com o ator Jake Gyllenhaal.
Há vários outros exemplos. Fãs apontam que “The 1”, do disco “Folklore”, lista críticas a Jow Alwyn, outro ex da cantora. “Eu tenho esse sonho que você está fazendo uma boa merda”, diz ela num dos versos. “Dear John”, por sua vez,
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