Entrevista: As máfias italianas não foram julgadas terroristas, diz secretário nacional de Segurança Pública
O secretário nacional de Segurança Pública, Mário Sarrubbo, criticou em entrevista ao GLOBO a megaoperação policial no Rio que deixou 121 mortos. Segundo ele, a ação não teve o objetivo de retomar território, algo necessário para desmantelar as facções. Integrante do Ministério da Justiça e Segurança Pública, Sarrubbo defendeu a ampliação de programa piloto do governo federal que visa à ocupação de áreas dominadas, o que, segundo ele, será discutido com o governo Cláudio Castro. Na frente legislativa, o secretário considera a proposta que equipara facções a organizações terroristas “incoerente e desonesta”.
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Como o projeto antifacção pode ajudar a resolver a crise?
Para solucionar o problema do crime organizado é preciso várias vertentes. E a legislação é importante. No fundo, o projeto vem para adaptar a legislação brasileira à realidade atual, diferente de 10, 15 anos atrás. Hoje, temos territórios dominados, com controle do ciclo econômico, venda de produtos e serviços que na verdade são do Estado e da sociedade civil, como internet, televisão, água, manipulação de mercados.
Qual é sua avaliação sobre a ideia da oposição de juntar esse projeto ao que equipara faccionados a terroristas?
Eu vejo isso como algo muito ruim. Essas facções não têm nenhum viés terrorista. Nesse debate, tenho visto alguns setores usarem de desonestidade. O problema do crime organizado não é falta de cooperação internacional. Reconhecer como terrorista não facilita nada. O projeto que está no Congresso ainda concentra o combate ao terrorismo no governo federal. Ele tira a Justiça Estadual e os Ministérios Públicos desse debate. Se, por um lado, eles não querem dividir a responsabilidade na PEC da Segurança Pública, agora querem aumentar o poder do governo federal no PL do Terrorismo. É um projeto que me parece incoerente, intelectualmente desonesto, e ainda mexe fortemente com a nossa soberania. Não são outros países que vão resolver o problema do Brasil. Essas nações já cooperam. As máfias italianas, por exemplo, não foram consideradas terroristas e não são. O terrorismo é um conceito ligado a projetos políticos, raça, religião. As facções são negócios: querem ganhar poder e dinheiro.
Como o senhor analisa a politização do debate da segurança pública?
Precisamos abandonar o populismo na discussão de segurança pública. Precisamos agir com base em evidências e dados.
O presidente Lula disse que houve “matança” no Rio e Cláudio Castro a classificou como um “sucesso”. O que o senhor achou da operação?
É difícil dar uma opinião. Mas o que eu posso dizer é que uma operação com quatro policiais mortos, outros tantos feridos e esse número de mortes... Operação de sucesso é operação sem mortos e com pouquíssimos feridos e as pessoas sendo presas e entregues ao sistema de Justiça. Não quero dizer que é simples fazer isso numa comunidade daquele tamanho. Mas sucesso é prender muita gente para que possamos investigar mais, produzir provas e inteligência para ações futuras e que sejam desestruturantes para essas facções.
A operação não serviu para retomar o território?
Tem que entrar, ficar e saturar. Não foi esse o objetivo da operação do Rio. Era uma operação destinada a cumprir cerca de 90 mandados de prisão. Se a gente olhar na perspectiva de retomar território, tem que ser bem diferente, porque a polícia tem que entrar e ficar. Em qualquer território dominado por facções as pessoas estão pedindo socorro. E precisamos transformar a realidade delas.
O governo vai fazer no Rio operações para seguir o dinheiro do tráfico, como ocorreu na Carbono Oculto?
Isso vai decorrer do trabalho de inteligência. A ideia da Carbono Oculto é o melhor dos mundos para nós. Mas não é só esse tipo de operação que vai acabar com o crime organizado. É preciso ter operação de retomada de território. Precisamos de tudo junto e procurar olhar de forma estratégica. A sociedade civil pode cumprir um papel importante nesse aspecto da lavagem de dinheiro. A pessoa física que compra uma capinha de celular falsa tem que saber que está alimentando o mercado ilegal, que é uma vertente do crime organizado.
O governador do Rio disse que tem mais dez operações agendadas. O governo federal vai atuar nessas ações?
Não, nós temos o Escritório (conjunto), mas só atuamos dentro do que nos compete, ou isso será feito dentro das Ficcos (Força Integrada de Combate ao Crime Organizado). O governo federal pretende trabalhar com foco na inteligência financeira, na questão das estradas e nas divisas.
Como está o programa de retomada territorial do Ministério da Justiça?
Temos uma experiência que está acontecendo neste momento e tem se revelado muito positiva. Devemos anunciar os resultados em breve. É uma área que já foi retomada pela polícia, e vamos entrar com os serviç
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