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Em bairro sem praça, o que resta é puxar a cadeira para sentar na rua

25/10/2025 13:27 Campo Grande News - Política

No Bairro Nova Lima, região norte de Campo Grande, a cadeira de fio ou plástico é patrimônio de vizinhança. Colorida, trançada, às vezes torta de tanto sol, ela é arrastada para a calçada e até na rua como quem ocupa o lugar cativo de sempre. Quem olha de fora vê famílias unidas e vizinhos que ainda conversam. Mas quem senta sabe: a rua é o que restou. Não é romantismo, é adaptação. O bairro, um dos mais antigos e populosos da capital, não tem praças em bom estado. “Não tem praça. A gente acaba ficando no meio da rua, como você tá vendo aqui. É dia de semana, é sábado, é domingo, tudo na rua, porque dentro de casa é calor”, conta Regina de Arruda Gomes, 37 anos, moradora desde os 11 anos. Mãe de quatro filhos, ela se equilibra entre o cuidado e o medo. “É perigoso pras crianças ficarem brincando assim, mas é o que tem.” As poucas praças da região são lembradas com ironia. “Tem uma, mas tá toda quebrada – os brinquedos e os bancos. A gente só quer um lugar para sentar e deixar as crianças brincarem”, diz. Para encontrar isso, é preciso atravessar dois bairros até o Santa Inês. “Mas é longe pra caramba. A gente vai quando dá”, completa, enquanto as crianças brincam, escalando as árvores da calçada. As cadeiras ficam nos portões, as crianças pedalam entre os carros e os vizinhos se revezam entre a conversa e a vigilância. É um bairro de famílias, de vidas simples, mas próximas, que vivem o cotidiano como quem divide quintal. Entre vizinhos e cachorros -  Como em quase todo quintal, há também os cachorros. “Tem muita gente que deixa cachorro na rua. Esses dias um mordeu minha filha”, conta Jennifer Souza da Silva, 21 anos. “O dono nem quis pagar o remédio. Quem ajudou foi o filho dele.” Regina confirma: “Tem dois aqui na rua que passam o dia inteiro soltos.” Ataques são raros, mas o incômodo é rotina. “O povo acha normal o cachorro viver solto, mas não é”, completa Jennifer. Enquanto falava com a reportagem, Nicole de Arroza, 30 anos, penteava o próprio cachorro em frente de casa. Ela nasceu e cresceu no bairro, mora ali há tanto tempo quanto a idade que tem. “Tem muito cachorro solto, sim, mas acho que é falta de responsabilidade mesmo, não é por causa da tranquilidade do bairro”, diz. Segundo ela, há moradores que acabam deixando os cachorros na rua. “Tem bastante cachorro de rua e muita gente que deixa os seus também. Aqui mesmo, nessa rua, há dois que passam o dia inteiro soltos. É perigoso, né?”, conta Nicole, que caminha pouco com a cadela justamente por isso. “A gente passeia só aqui na rua mesmo, com cuidado, porque tem muito cachorro solto.” A lenda da creche -  Na Rua Nazira Anache, o sonho de um espaço pra infância se arrasta há mais de dez anos. O prédio da creche municipal, ainda em reforma, é conhecido por todos como “a lenda do Nova Lima”. “Essa creche é mais velha que muita gente aqui. Quando eu era criança, já lembro do terreno sendo preparado. E até hoje nada”, diz Regina. Agora há uma placa nova, prometendo a entrega em dezembro, promessa da qual os moradores já aprenderam a duvidar. “Já começaram e pararam mil vezes. Agora falam que vai sair. A gente quer ver funcionando.” Enquanto a obra dorme no tempo, crianças seguem esperando por vagas. “Desde o começo do ano tento vaga pro meu filho de 4 anos e nada”, conta Jennifer, que tenta equilibrar o trabalho como revendedora da Natura com o cuidado da filha adotiva. “Tem só uma creche funcionando. As outras são longe. E as crianças ficam brincando na rua porque não tem onde deixar.” Mesmo quem chegou há pouco percebe o cenário. Diana Castro, 31 anos, mora há um mês no bairro. “Hoje foi a primeira vez que vim na praça e dá pra ver que falta tudo: brinquedo, banco, cuidado. Até a rede de vôlei tá furada. Assim ninguém vem.” Trabalho de quintal -  A mesma força que move o bairro a ocupar as calçadas também empurra o morador a inventar o próprio trabalho. No Nova Lima, o senso de comunidade e a falta de oportunidades caminham lado a lado: é um bairro que se ajuda, mas também precisa se virar. As esquinas estão cheias de pequenos comércios e barracas improvisadas, quase sempre tocadas pelos próprios donos. “Há muitas lojas, mas a maioria pertence aos próprios donos; eles trabalham para si mesmos e não têm como contratar”, resume Saulo Amorim de Luna, 63 anos, aposentado por invalidez. Ex-funcionário de empresa de ônibus, Saulo sofreu um acidente que o deixou três anos sem andar. “Perdi metade da capacidade física. Aposentei, mas não dá pra viver só com isso. Pago 700 de aluguel, quase 200 de contas. O jeito é vir pra rua.” Hoje, vende cigarros, isqueiros e MS Cap em um carrinho. “Ou eu faço isso ou passo fome. Não tem como ficar parado.” A poucas quadras dali, o artesão Cícero Coelho, 61 anos, encontrou outro jeito de seguir. Morador há 37 anos na região do Jardim Anache, ele transformou o quintal em oficina e sustento. “Trabalho com caminhão e, nas horas vagas, com o artesanato. Se eu pegar firme, faço umas cinco tábuas por

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