
Como dar conta das nuances de escolhas a que as mulheres têm direito
Em tempos de polarização crescente, é urgente redimensionar com mais nuances o que chamamos de sucesso, especialmente quando falamos de mulheres. Há quem defenda que sucesso é libertar-se das amarras de um mundo machista e misógino: romper com os papéis tradicionais, conquistar autonomia financeira, ocupar espaços de poder e multiplicar as conquistas profissionais.
Por outro lado, cresce o coro de quem entende o sucesso como o direito de desacelerar, de ter tempo para cuidar exclusivamente da família, da casa, do corpo e da mente. Entre o “trabalhar até esgotar” e o “abrir mão de tudo para cuidar”, existe um território que pode ser melhor explorado: o das nuances. E aí que temos o desafio e a possibilidade de fortalecer narrativas que estão no meio do caminho.
Durante muito tempo, o sucesso feminino foi contabilizado pelo tempo que passava em casa, cuidando do lar e da família. Mais recentemente, para muitas, ficou pautado pelo tempo que passavam fora de casa e por números como cargos, salários, viagens, diplomas.
Nenhum dos extremos dá conta completamente da complexidade de ser mulher em um mundo que ainda insiste em nos colocar em caixinhas. Precisamos constantemente reconhecer que há diversos tons de opções entre o “trabalhar sem parar” e o “abrir mão do trabalho”. Mulheres que querem empreender sem abrir mão da maternidade. Mulheres que encontram propósito em cuidar. Mulheres que encontram cura no movimento. E tantas outras que vivem o dilema entre querer tudo e, às vezes, nada.
E então entra o verbo mais difícil de praticar: acolher. Acolher as suas escolhas, mas também a das outras mulheres, mesmo quando não faríamos igual. Não significa concordar, mas respeitar. É permitir que a pluralidade de trajetórias femininas exista sem caber num rótulo. É mais trabalhoso do que julgar, porque exige escuta, contextualização, empatia e autocrítica.
O acolhimento, diferentemente do julgamento, é expansivo. Quando uma mulher é acolhida em sua escolha, outras também se sentem mais livres para fazer as suas. É assim que o sucesso se torna um conceito coletivo, contextual, e não apenas individual e padronizado.
Eu mesma tenho aprendido e reaprendido o significado de sucesso em diferentes fases da vida. Já o associei à visibilidade, à entrega e à pausa. E, entendo, com muita humildade para seguir aprendendo, que o verdadeiro sucesso é poder escolher e ser respeitada por isso.
Nem toda mulher precisa ser CEO, nem toda mulher precisa ser mãe. Também não precisa querer o palco ou preferir o silêncio. O que precisamos é de liberdade real para transitar entre esses tons, de acordo com o momento, o desejo e as condições de cada uma.
Que a próxima geração possa olhar para nós e ver menos polarização e mais nuances. Que vejam que o sucesso pode ser múltiplo, mutável e, sobretudo, humano. E que, entre tantos tons de cinza, a gente siga pintando a vida com todas as cores e nuances possíveis da escolha, sem tanta culpa, julgamento, e com muito acolhimento.
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