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Retirada de árvores revela vida escondida durante anos em área nobre da Capital

17/10/2025 21:50 Campo Grande News - Política

A lona azul suspensa entre troncos remanescentes do corte de árvores é o que sobrou de uma vida que ninguém notava, até agora. Nos últimos anos, um homem viveu em silêncio às margens do Córrego Prosa, na Praça das Águas, no trecho que fica em frente à Câmara Municipal. Dormia, cozinhava, lavava roupa e existia entre galhos e sombras, sob uma mata feita de leucenas, que agora foi retirada por questões ambientais. Assim o acampamento foi revelado. O homem já não e visto por lá, mas a estrutura frágil ficou, resoluta, com madeiras fincadas para sustentar a lona, galhos entrelaçados servindo de teto improvisado, algumas ripas segurando o mínimo necessário. No chão, um colchão rústico coberto por cobertores doados. Sapatos deixados cuidadosamente ao lado da lona. Panelas negras, marcadas pelo uso com lenha, escondem o fogo com que ele fazia sua comida, quase sempre com pequenos gravetos ou álcool. O espaço é pequeno. Os utensílios bem dispostos junto ao abrigo, uma panela pendurada, restos de cinzas indicando fogueira recente. Ao lado, um cantinho com mantimentos simples e um comedouro para gatos improvisado. “Ele vivia aqui há 20 anos. Era parte da paisagem, mas também o guardião dela. Cuidava das árvores, dos bichos e do rio”, diz Francielle Zamora, de 38 anos, tenente do Exército e síndica do Condomínio Cachoeirinha 1.  “Depois da derrubada, ele entrou em depressão. E sumiu. Nunca mais deixou a bandeira na grade do condomínio”, conta, sobre a forma peculiar de comunicação: ele deixava a bandeira para avisar que estava em casa e bem. Ela explica que, durante o corte das árvores, funcionários da prefeitura chegaram a ver o abrigo e tentaram convencer o senhor de aproximadamente 60 anos a sair dali, oferecendo levá-lo para outro lugar. “Mas ele não aceitou. Disse que não queria sair. Aquele era o lar dele, o espaço que ele mesmo construiu”, lembra. A barraca que restou, com lona azul entre os troncos, é testemunha muda do ex-ocupande conhecido apenas como Dirceu. Segundo ela, o homem chegou àquela mata depois de uma tragédia pessoal: perdeu a esposa e os dois filhos num acidente de carro. Depois disso, as sequelas dos joelhos o tornaram dependente de passos lentos. Encontrou, entre as árvores, um abrigo modesto, mas seu refúgio. Mesmo debilitado, ele zelava por seu espaço, limpava, organizava, mantinha o mínimo de ordem. “Ele dizia que a sombra das árvores era o teto dele. Nunca pedia nada, só queria ficar em paz”, lembra Francielle. O desgosto de Dirceu veio com a proibição de leucenas, árvores consideradas espécie invasora, “peste vegetal”, e estão sendo retiradas em vários pontos da cidade, inclusive nas margens de córregos. Mesmo com a necessidade do corte para reposição com outra espécie, Francielle critica a forma e o impacto da ação. “É proibido remover mata ciliar. Essas árvores protegiam o rio, evitavam o assoreamento e o lixo. Agora, o barranco está cedendo.” Hoje, a lona azul e as ripas remanescentes se destacam num cenário de árvores derrubadas. A Prefeitura de Campo Grande informa que o processo é inevitável, para a reposição de mata que não comprometa o bioma local. Receba as principais notícias do Estado pelo Whats. Clique aqui para acessar o canal do Campo Grande News e siga nossas redes sociais .

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