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Meu Jogo: 'Foi um turbilhão de emoções. Tinha medo de como seria meu futuro no futebol', conta Ketlen Wiggers após descobrir gravidez

08/11/2025 05:00 O Globo - Rio/Política RJ

Eu descobri a epilepsia com 19 anos. O primeiro episódio foi com a minha mãe, enquanto eu falava com ela ao telefone. Eu estava assistindo novela, e de repente parei de falar. Ela ficou esperando do outro lado da linha. Quando voltei, fiquei meio confusa — minha epilepsia é do tipo que te deixa uns 10 segundos fora do ar.
Quando recobrei a consciência, olhei para o telefone e pensei: “Ué, tô falando com alguém?”. Perguntei: “Alô, tem alguém aí?”. Aí minha mãe respondeu: “Filha, sou eu! Você tava falando comigo!”.
Contei que tinha “me dado um branco”, que fiquei alguns segundos fora do ar e esqueci completamente que estava conversando com ela. Foi quando ela se preocupou de verdade e disse que precisávamos investigar. Meu irmão já tinha convulsões, então ela achou que poderia ser algo parecido. Fui ao médico e descobri que era epilepsia.
O primeiro médico que procurei — o mesmo que cuidava do meu irmão — me disse que eu não poderia jogar futebol por ser epilética. Busquei outras opiniões e dois médicos disseram o mesmo.
Quando vim para São Paulo, ouvi de um terceiro médico algo diferente. Ele perguntou: “Você já teve crises dentro de campo, em treino ou jogo?”. Respondi que não. Ele então disse: “Se nunca teve em campo, pode continuar jogando. Só não dirija por um tempo até regular o tratamento”. Era o que eu precisava ouvir. Continuei jogando, focada no meu sonho. Sabia que a epilepsia não ia me parar.
A atacante do Santos Ketlen Wiggers, de 33 anos, espera a chegada de Lucca
Maria Isabel Oliveira
Passei cerca de um ano até achar esse médico. Nesse período, fiz muitos exames e continuei jogando, já estava no Santos, mesmo sem resposta definitiva. Demorei também a achar o remédio certo. Troquei várias vezes, porque alguns paravam de fazer efeito. Cheguei a ter umas 40 crises por dia. Era terrível. Eu começava a conversar e de repente esquecia o que estava falando. Até que combinamos dois medicamentos, um deles infantil, e finalmente funcionou.
Tive outros episódios marcantes. Um deles foi durante uma apresentação na faculdade: eu estava lá na frente, falando, e de repente apaguei por alguns segundos. Quando voltei, não lembrava o que estava dizendo, perdi totalmente o raciocínio. Meus colegas começaram a rir, e aquilo me marcou muito. Por vergonha, escondi a doença por muito tempo.
Durante muito tempo, ninguém sabia. As pessoas achavam que eu era “desligada”. Minha mãe sempre dizia: “Filha, conta isso, as pessoas precisam saber”. Mas eu tinha medo. Até que, em 2022, vi aquele episódio do Will Smith batendo no comediante por causa da esposa. Aquilo me fez refletir sobre o que eu escondia. Peguei o celular e gravei um vídeo contando minha história.
Depois que postei, liguei para minha mãe desesperada: “Mãe, postei o vídeo, contei tudo, acho que vou apagar!”. Ela respondeu: “Não apaga! Você fez o que precisava ter feito há muito tempo. As pessoas precisam ouvir isso de alguém público, que mostre que é possível viver com epilepsia”.
O retorno foi incrível. Achei que seria criticada, mas recebi só mensagens positivas. As meninas do Santos me abraçaram, me apoiaram muito. Algumas disseram: “Então era por isso que acontecia aquilo e você nunca contou para gente!”.
Recebi mensagens de mães que tiraram os filhos do futebol por causa da epilepsia e que, depois do meu depoimento, decidiram deixá-los jogar. Foi emocionante ver o quanto minha história ajudou outras pessoas. Hoje, todo mês de março — o mês roxo, da conscientização sobre epilepsia — eu falo sobre o tema nas redes sociais. Uso faixas ou chuteiras roxas e tento sempre levantar essa bandeira.
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Maria Isabel Oliveira
A gravidez
E ter um filho sempre foi meu sonho. Eu já conversava com meu médico sobre isso, porque tomava remédios que não poderiam ser usados na gravidez. Já faz nove anos que não tenho crises. Há cerca de três anos, quando o DIU venceu, combinamos de tirar o medicamento infantil para testar o tratamento só com o que é seguro para gestantes.
Deu certo. Desde então, eu e meu marido deixamos nas mãos de Deus. Quando tivesse que acontecer, aconteceria. Aconteceu este ano. Estamos juntos há 13 anos. Ele é médico e me ajudou muito desde o começo, entendendo minhas crises, me protegendo quando eu ficava fora do ar em conversas. Ele percebia que eu tinha apagado e mudava de assunto até eu me recuperar, por exemplo. Foi uma decisão dos dois: “Se for para acontecer agora, que seja”.
Descobri a gravidez em abril. No treino, senti os seios doloridos e minha menstruação estava um pouco atrasada. Em outro dia, perguntei a uma amiga de time, se ela também estava se sentindo enjoada com o cheiro de comida. Ela disse na hora: “Ih, você tá grávida!”. Fiz dois testes de farmácia, que deram positivo. Fiz o de sangue e já estava com seis semanas. Joguei grávida sem saber, mas só em amistosos. Acho que foram três: contra o Palmeiras, contra o Taubaté e contra a base das meninas. O Luca já tinha

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